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Planejamento de Demanda: Estabilidade de Previsões VS Renovação de Portfólio

Por Henrique Alvarenga.

1. INTRODUÇÃO

A inovação se tornou o principal driver de crescimento e prosperidade das empresas no século XXI. Já em 2013, 27% das vendas das empresas estavam relacionadas a produtos lançados nos 3 anos anteriores. Além disso, a vida dos produtos reduziu em 400% nos últimos 50 anos. É possível observar na figura 1 que, no futuro, é esperada a continuidade do crescimento percentual de produtos com 5 anos ou menos. Tais dados comprovam a importância do lançamento de novos produtos e como eles se tornarão cada vez mais representativos no portfólio de produtos ofertados.

Figura 1 – Idade planejada de produtos para os 7 anos seguintes, pesquisa realizada em 2013.

Gráfico - Idade planejada de produtos para os 7 anos seguintes, pesquisa realizada em 2013

Análise: Product Lifecycle Management Volume 2 (2015)

Esta tendência, porém, cria uma série de desafios operacionais para as empresas. Por exemplo, o planejamento de demanda, ponto inicial dos processos fabris e logísticos, deverá responder da melhor forma a uma série de dificuldades criadas. A constante introdução de novos produtos não permite que as séries de vendas sejam longas o suficiente para fornecer boas previsões. A redução do ciclo de vida dos produtos também reduz o tempo útil das séries. Em outro aspecto, as séries de demanda para variados SKUs de uma mesma categoria não são independentes, ou seja, as séries históricas não preveem interação na demanda de produtos. Com isso, as incertezas ao longo da cadeia tendem a crescer, causando redução na acurácia das previsões. Estas incertezas podem causar problemas graves com rupturas, altos níveis de estoque e prejuízos tanto financeiros quanto para a marca.

Neste artigo serão abordados aspectos como o efeito portfólio e a velocidade de expansão, além de um endereçamento prático de como enfrentar o problema. O Demand-driven Supply Chain e o Big Data também serão abordados vista a importância de tais temas no cenário moderno de processamento de dados e gestão da cadeia de suprimentos.

 

2. EFEITO PORTFÓLIO E NOVOS PRODUTOS

 

2.1. O Efeito Portfólio

Como foi descrito acima, estamos vivendo uma fase de crescimento acelerado no ritmo das inovações nas empresas. Nunca se buscou tanto lançar novos produtos e se diferenciar, e o que se espera para o futuro é a continuidade dessa tendência, com a inovação mantendo seu posto de protagonista na geração de valor sustentável.

Com essa quantidade de produtos sendo lançados no mercado, o consumidor tem, cada vez mais, diferentes opções. Além disso, as pessoas possuem cada vez mais informações a respeito dos produtos que consome, definindo suas preferências de maneira pessoal e realizando suas escolhas de produtos considerando variados critérios. É muito raro um cliente ser fiel a uma marca ou produto a ponto de, no caso de não o encontrar na gôndola de um varejo, desistir da compra. Em posse de informações do que aquele SKU oferece e dadas as inúmeras opções de similares, é muito provável que o cliente opte por um produto semelhante.

Peguemos, por exemplo, o lançamento de um novo sabor de suco em lata. O lançamento deste novo sabor não criou novo espaço nas gôndolas dos supermercados, tendo, portanto, que disputar espaço com outros produtos da mesma marca, ou seja, com outros sabores de suco. Isso pode afetar as vendas destes outros sabores, dada a menor exposição do produto. Vamos imaginar agora a venda de um suco de mesmo sabor, porém os SKUs de 350 mL (lata) e o de 600 mL (garrafa PET). Se um consumidor não encontra uma lata de suco para consumo imediato, é provável que ele consuma a de 600 mL em substituição à lata não encontrada. Nestes casos, percebe-se que as demandas dos diferentes SKUs (seja o mesmo produto em embalagens diferentes ou produtos diferentes da mesma família) não são independentes, o que gera mais incertezas sobre sua previsão. Esta “canibalização” entre produtos é conhecida como Efeito Portfólio.

O Efeito Portfólio causa ainda mais incertezas a respeito da demanda dos produtos, e em lançamentos esta incerteza é ainda maior dada a inexistência de dados históricos do novo produto. É importante, portanto, entender quais são as características dos novos produtos para definir a melhor forma de realizar sua previsão de demanda.

Figura 2 – Lançamento de produtos similares podem afetar as demandas de outros produtos da mesma família.

Imagem - Produtos Somersby

Análise: Wikimedia Commons

 

2.2. Novos Produtos

Um novo produto é lançado por inúmeras razões, dentre as quais se destacam:

  • Melhoria de custo – Produto idêntico a outro existente, porém com custos associados reduzidos, oferecido ao mercado atual.
  • Melhoria do produto – Produto já existente, porém com melhorias e com desempenho superior, oferecido para o mercado atual.
  • Extensão de linha – Produto já existente, porém com inovações incrementais, oferecido para o mercado atual.
  • Novos usos – Produto já existente, porém com melhorias que o permitem atender novas necessidades, oferecido para o mercado atual.
  • Extensão de mercado – Produto existente sendo oferecido para um mercado diferente
  • Novo para a empresa – Produto e mercado completamente novos para a empresa, porém não para os concorrentes.
  • Novo para o mundo – Produto e serviços radicalmente diferentes sendo oferecidos para mercados atendidos por outro tipo de produto ou serviço.

Cada uma destas características pode auxiliar na definição da melhor maneira de realizar a previsão da demanda, conforme será mostrado a seguir.

 

2.2.1. Previsão Estatísticas para Novos Produtos

A escolha da técnica de previsão depende de vários aspectos, como disponibilidade de informações, tempo e recursos. Existem várias técnicas de previsão, que podem ser agrupadas em três categorias:

  • Julgamento: Utiliza a experiência e a intuição para definição da previsão. Exemplos: Opinião de um júri executivo, opinião da força de vendas, Análise de Cenários, Técnica Delphi, Árvore de Decisão.
  • Modelos Quantitativos: Utiliza métodos matemáticos e estatísticos para definir a previsão. Podem ser divididos em três grandes grupos: séries temporais (Análise de Linha de Tendência, Média Móvel, Amortecimento Exponencial, Box-Jenkins); modelos casuísticos (Regressão Linear, Regressão Não-Linear, Regressão Logística); ou outros métodos (Sistemas Especialistas, Redes Neurais).
  • Técnicas de Pesquisa do Consumidor e Mercado: Utiliza informações coletadas em pesquisas de mercado. Exemplos: Teste de conceito, Teste de uso do produto, Teste de mercado, Teste de pré-mercado.

O aprofundamento das técnicas de previsão está fora do escopo deste artigo.

De acordo com as características tecnológicas e o mercado-alvo que o novo produto apresenta, uma estratégia específica para previsão de demanda pode ser escolhida., conforme se observa na figura 3.

Figura 3 – Matriz mercado vs tecnologia para previsão de novos produtos.

Figura - Matriz mercado vs tecnologia para previsão de novos produtos

Fonte: The PDMA Handbook of New Product Development (2012).

Quando o mercado e a tecnologia são atuais, e a inovação traz uma melhoria de custos ou de produto, uma análise quantitativa das vendas é sugerida visto que o produto possui similar no mercado. Neste caso, as incertezas a respeito do comportamento da demanda tendem a ser menores.

No caso de um produto apresentando nova tecnologia, porém voltada para o mesmo mercado de produtos de sua família, uma análise da linha de produtos e de ciclo de vida é recomendada. Isto significa que um método quantitativo pode ser usado a partir dos dados de venda histórica dos produtos da mesma linha, realizando um ajuste conforme as expectativas do início do ciclo de vida do produto, dadas as experiências anteriores com lançamentos. Utilizar métodos de julgamento, como a Técnica Delphi, pode ser interessante para comparar as opiniões de diferentes especialistas do processo com os resultados dos métodos quantitativos.

Quando o produto possui tecnologia atual, porém será introduzido num novo mercado, uma análise de mercado e de cliente pode ser feita, a fim de entender melhor as características destes novos consumidores e reduzir as incertezas sobre o comportamento da demanda futura.

No caso de uma nova tecnologia e um novo mercado, as incertezas são ainda maiores e uma análise de cenários é sugerida. Por conta da inexistência de dados, técnicas subjetivas podem ser utilizadas.

Cabe ressaltar que, se não houver limitações de recursos e tempo, tais sugestões podem ser beneficiadas pela combinação de diferentes técnicas de previsão.

 

3. HEURÍSTICAS DE RACIONALIDADE

O campo da economia comportamental teve, em 2017, mais um de seus pesquisadores premiado com o prestigioso Nobel de Economia. O professor da Universidade de Chicago Richard H. Thaler apresentou conceitos como racionalidade limitada, preferências sociais e falta de autocontrole e descreveu como tais traços humanos afetam sistematicamente as decisões tomadas, mostrando o porquê de tais comportamentos exercerem grande impacto no mundo corporativo.

Nos ambientes de negócios, onde pressupõe-se decisões racionais, as restrições de tempo e de custo, aliadas a crescente complexidade do mercado e de seus mecanismos competitivos, levam a adoção de um conjunto de regras simplificadoras, conhecidas como heurísticas de decisão, que simplificam o processo, mas conduzem a erros sistemáticos e de difícil eliminação.

No processo de planejamento da demanda, o uso destas heurísticas pode ser verificado, seja para estimar as vendas, definir o impacto específico de uma ação comercial ou mensurar o sucesso no lançamento de um produto. Quanto mais complexo for o ambiente, mais difícil é o processo de interpretação das informações e mais propenso estará o planejador a utilizar inconscientemente alguma regra simplificadora. Vejamos os exemplos a seguir:

 

3.1. Heurística da Representatividade

A Heurística da Representatividade é a tendência humana de emitir conclusões a partir de observações não representativas ou tendenciosas. Esta heurística é utilizada quando se tenta responder perguntas do tipo “qual a probabilidade do objeto A se enquadrar em uma categoria B”. Esta lógica heurística pode levar a erros sempre que entrar em conflito com a lógica probabilística.

Isto poderia ocorrer no caso de um lançamento de um novo produto de uma marca famosa, por exemplo. Por ser uma marca de sucesso, cujos produtos são consagrados no mercado, o planejador pode inferir que o lançamento do novo SKU será, consequentemente, um sucesso. Isso pode levar a superestimações de níveis de estoque e a custos indesejados.

 

3.2. Heurística da Disponibilidade

A Heurística da disponibilidade está relacionada com a lembrança de informações vívidas e recentes. Existe a tendência de considerar uma alta probabilidade de ocorrência de dado evento pelo fato do mesmo evento ter ocorrido recentemente. Por exemplo, quando há um acidente de avião ou de carro e as pessoas passam a evitar tomar tais meios de transporte por achar que a probabilidade de ocorrência deles aumentou após o evento.

Nem sempre é fácil fazer a distinção do que realmente impacta a probabilidade de um evento ocorrer. O entendimento da heurística da disponibilidade é fundamental em situações de exceção no planejamento da demanda, como promoções e eventos esporádicos.

No caso de um lançamento de um novo produto, é comum e bem visto a recuperação de experiências anteriores similares para servir como ponto de partida para o planejamento da demanda. Porém sua utilização, sem considerar mudanças no contexto comercial, novas conjunturas de mercado e da economia, mudanças na concorrência ou no poder de compra dos consumidores, pode levar a erros relevantes. Fiar-se somente das lembranças é um atalho que pode levar a grandes prejuízos.

 

3.3. Outras Heurísticas

Outras heurísticas, como Âncora e Ajustamento, Previsão Retrospectiva e a Armadilha da Confirmação, também desempenham papel relevante no processo de planejamento da demanda. Além de ter um processo estruturado, baseado na utilização de modelos estatísticos de previsão de vendas e na conciliação dos planos comerciais e operacionais, um bom planejamento depende de planejadores que conheçam estas heurísticas e sejam capazes de reconhecer seus impactos e características, a fim de evita-las.

 

4. DEMAND-DRIVEN E O BIG DATA

Espera-se que a melhor resposta para este dilema entre a utilização de previsões de vendas e o constante lançamento de novos produtos está na cadeia de suprimentos voltada para a demanda real, ou o Demand-driven Supply Chain. Quanto menos a cadeia depender de previsões de vendas históricas e conseguir, em tempo hábil, informações da demanda real para engatilhar os outros elos da cadeia de suprimentos, melhor para a acurácia de previsão e menor a probabilidade de incorrer em altos custos associados a rupturas e estoques em excesso.

Além disso, o advento de tecnologias de Big Data irá permitir o processamento de informações de variadas fontes a respeito das preferências e escolhas dos consumidores. É possível que, num futuro próximo, as pesquisas de mercado, que hoje são custosas e tomam muito tempo, ocorram em tempo real e continuamente, para que forneçam importantes informações a respeito da demanda. Outras tecnologias como Inteligência Artificial, Impressão 3D, Drones e a Internet das Coisas permitirão que as cadeias sejam ágeis e flexíveis para responder a este novo paradigma de atendimento à demanda.

 

5. CONCLUSÃO

Visto que as inovações e os lançamentos de novos produtos e serviços continuarão crescendo e sendo importantes para as empresas, cabe aos planejadores de demanda lidar da melhor forma com as técnicas disponíveis para atuar na previsão das demandas num contexto de alta incerteza. A colaboração é fundamental para que as informações fluam com agilidade entre os departamentos e os elos da cadeia. A utilização de determinadas técnicas de previsão deve ser feita de acordo com critérios como características do produto e do mercado e tempo/ informações disponíveis. Outro cuidado importante é evitar a utilização de heurísticas e vieses para a tomada de decisão, que podem levar a resultados abaixo do esperado.

Com o advento de novas tecnologias que permitam uma maior colaboração entre os elos da cadeia e uma coleta/processamento de mais informações em tempo real, se espera que estas incertezas sejam mitigadas e um alinhamento maior entre as previsões e a demanda real ocorra.

 

BIBLIOGRAFIA SUGERIDA

  • KAHN, Kenneth B. The PDMA handbook of new product development. John Wiley & Sons, 2012.
  • STARK, John. Product lifecycle management. In: Product Lifecycle Management (Volume 1). Springer International Publishing, 2015. p. 1-29.
  • WANKE, Peter; JULIANELLI, Leonardo. Previsão de Vendas: Processos Organizacionais & Métodos Quantitativos E Qualitativos. Editora Atlas SA, 2000.

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