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Os “7 pecados capitais” em Compras e Suprimentos e como evitá-los


Após 15 anos atuando nos “dois lados da mesa” – como consultor e executivo de Compras e Suprimentos e também de Negócios e Vendas – e de 9 anos lecionando disciplinas afins em programas de pós-graduação, eu ainda me incomodo com a gravidade e a persistência de alguns problemas encontrados, com assustadora frequência, nas práticas de Compras e Suprimentos nas empresas. Os efeitos nocivos para os negócios e a competitividade das organizações nos diferentes segmentos econômicos, sobretudo num contexto de competição e de inovações disruptivas crescentes, são expressivos porém não suficientemente (re)conhecidos.

compra e suprimentos - ILOS Insights

A literatura e os treinamentos disponíveis ignoram ou apenas tangenciam estes relevantes problemas, tipicamente limitando-se aos aspectos técnicos de uma atividade complexa cujos fatores críticos de sucesso vão muito além e englobam também questões estratégicas, comportamentais e de governança.

Neste breve artigo eu recorri à metáfora dos “7 pecados capitais” para dar a devida ênfase aos graves problemas que afligem as áreas de Compras e de Suprimentos e sobre os quais eu disserto a seguir baseado no meu conhecimento empírico (corporativo e acadêmico) e no dos meus clientes, pares e alunos.

Todos estes problemas e as respectivas recomendações para eliminá-los eu abordo de forma mais ampla e profunda no curso de curta duração (12h na modalidade on-line ao vivo) “Gestão Estratégica de Compras e Suprimentos” que eu ministro periodicamente no ILOS.

1. Desalinhamento com as prioridades e com o modelo de negócio da empresa

Há alguns anos o Diretor de Suprimentos da filial brasileira de uma gigantesca multinacional atuante no setor de Oil & Gas sintetizou da seguinte forma o maior desafio que ele enfrentava naquele momento e que gostaria que direcionasse o conteúdo do treinamento in-company que eu ministraria nas próximas semanas para a sua equipe: “O barril de petróleo está na faixa de USD 50 e o meu time continua trabalhando como se ainda estivesse em quase USD 100, quando a preocupação com custos era quase que inexistente.”. Ainda mais grave é quando as áreas de Compras e Suprimentos não compreendem com a devida profundidade as peculiaridades do modelo de negócio da sua empresa e não atuam em conformidade. Aplicar as mesmas técnicas de sourcing e da mesma forma numa BMW e num Carrefour é um equívoco tão sério quanto surpreendentemente comum.

O alinhamento da estrutura de Compras e Suprimentos com o negócio da empresa deve ocorrer de forma contínua, sistemática e em todos os níveis do seu organograma. Desde por meio da participação proativa e frequente dos seus líderes (diretores, gerentes, etc.) em discussões estratégicas com seus pares de outras áreas sobre como Suprimentos pode e deve viabilizar o atingimento das metas corporativas e apoiar os projetos e negócios prioritários para a empresa, passando pela formação de equipes multifuncionais (lideradas ou não pela área de Suprimentos) e alcançando ações tais como compradores vivenciarem de tempos em tempos a realidade operacional dos seus clientes internos (requisitantes) para entenderem as suas necessidades e desafios.

2. Atuação exclusivamente operacional e reativa

Uma das queixas mais frequentes que eu ouço tanto de requisitantes quanto de compradores é de que “Compras só apaga incêndio”. Ou seja, recebe dos requisitantes demandas sempre “para ontem” e com especificações inadequadas – vagas e incompletas gerando riscos expressivos de “comprar errado” ou o seu oposto, tão específicas e direcionadas para um ou poucos fornecedores que inviabilizam qualquer processo concorrencial minimamente competitivo -, é cobrada para executar atividades que deveriam ser dos requisitantes ou de outras áreas da empresa (diligenciamento de fornecimento e resolução de problemas de pagamento a fornecedores, p.ex.) e acaba atuando de uma forma meramente operacional e reativa e com o único propósito de “apanhar pouco” dos requisitantes. Todos (com exceção dos fornecedores, que apreciam muito lucrar com a incompetência dos seus clientes) perdem: requisitantes, compradores e, sobretudo, os acionistas da empresa.

Transformar esta realidade exige medidas estruturais em nível corporativo: redirecionamento estratégico da área de Suprimentos; treinamento; sistemas de informação adequados; e normas e procedimentos que definam claramente as responsabilidades de cada área (Suprimentos, requisitantes, Jurídico, etc.) e as punições por eventuais desvios, os fluxos dos processos internos e externos (desde a emissão do pedido de compra até o efetivo fornecimento e pagamento ao final), os SLAs (Service Level Agreements) e KPIs (Key Performance Indicators) internos e externos e outros aspectos essenciais para padronizar e otimizar as atividades rotineiras de Compras. Adicionalmente, a área de Compras e Suprimentos deve se estruturar internamente de forma a possuir equipes específicas para as atividades mais operacionais e transacionais (emissão de pedidos de compra spot, cadastro de fornecedores, cadastro de itens de fornecimento, etc.) e outras para as atividades mais estratégicas (Strategic Sourcing, gestão de categorias e de fornecedores, Inteligência de Suprimentos, etc.).

3. Desequilíbrio entre busca por resultados e mitigação de riscos de fornecimento

Certa vez eu concluí a minha orientação a um novo membro da minha equipe de Suprimentos (um Especialista encarregado por algumas categorias de fornecimento relevantes) dizendo o seguinte: “Lembre-se: evitar descontinuidades de fornecimento é requisito básico para você manter o seu emprego, mas sem entregar resultados você não cumprirá as suas metas e não crescerá na empresa.”. Na maioria das empresas não há diretrizes suficientes para balizar o quanto de risco de fornecimento é aceitável assumir em prol de alavancar resultados (em termos de savings, qualidade, lead time, etc.). Como consequência, as decisões são tomadas empregando critérios não homogêneos e sob a interferência de questões políticas e circunstanciais. A minha experiência mostra que tanto requisitantes quanto compradores com funções operacionais tendem a ser mais conservadores (priorizando a manutenção de fornecedores e de modelos de fornecimento), em contraste com executivos (gerentes e superiores) que costumam apresentar uma maior propensão a mudanças e inovações. Isto decorre, principalmente, de diferenças nas metas profissionais (usualmente mais financeiras e agressivas para os níveis executivos e mais operacionais para os demais).

Em cada segmento econômico é variável a relação entre “risco e retorno” que faz sentido ser buscada nas decisões estratégicas e operacionais (incluindo as decisões de Compras e Suprimentos). Em setores nos quais os riscos são intrinsecamente maiores (farmacêutico, nuclear, aeronáutico, etc.) ou onde há maiores margens de lucro (bens de consumo de luxo, p.ex.) é natural que os riscos de fornecimento sejam uma preocupação maior do que a busca por resultados do que em outros nos quais a competição é essencialmente via eficiência em custos (setor supermercadista, p.ex.) ou via inovações em seus produtos (indústria eletroeletrônica, p.ex.). A área de Suprimentos deve possuir políticas, metas e procedimentos que sejam coerentes com estas idiossincrasias do negócio de cada empresa e sempre tomando as decisões de fornecimento em comum acordo com os seus requisitantes e visando a maximização do valor para os acionistas. E sempre lembrando que sem assumir riscos (de forma planejada, recomenda-se) não há retorno.

4. Relacionamento inadequado com requisitantes (clientes internos)

Este é um problema tão comum que é praticamente um clichê corporativo. Tão deletéria quanto uma área de Compras e Suprimentos ser “capacho” dos seus requisitantes é o seu extremo oposto, que é assumir uma postura de antagonismo permanente. O resultado prático, em ambos os casos, é um “abraço de afogados” no qual os dois lados acabam tendo muito mais dificuldade para alcançar as suas metas em função dos conflitos improdutivos que minam a exploração do quase sempre subutilizado potencial de ações colaborativas e convergentes.

100% dos projetos de Strategic Sourcing que eu e a minha equipe conseguimos desenvolver (alguns dos quais premiados) só foram viáveis quando conseguimos forjar a única relação recomendável em relação aos requisitantes: a de parceria. A construção de genuínas relações de parceria exige tempo, esforço, confiança mútua e transparência para o alcance de interesses comuns, mas o retorno quase sempre compensa o “investimento”.

5. Gestão inadequada ou inexistente de fornecedores

Em contraste com a relação entre Suprimentos e requisitantes que deve ser sempre de parceria, a relação com os fornecedores deve depender de variáveis críticas tais como risco de fornecimento e impacto (financeiro, estratégico, etc.) do item fornecido no negócio da empresa e também do equilíbrio de poder entre fornecedor e cliente. Mas há um número expressivo de empresas que não efetuam essas análises e, ainda mais grave, não possuem um processo apropriado e institucionalizado de gestão contínua de fornecedores. O resultado é uma ampla gama de sérios problemas: dependência de fornecedores, maiores riscos de fornecimento, negociações desvantajosas com fornecedores, piores resultados (em termos de savings, qualidade, lead time, etc.), riscos aumentados de compliance, etc.

As boas práticas contemplam o uso de ferramentas de segmentação de categorias e de itens de fornecimento (Matriz Kraljic e MPEM, p.ex.) e de categorização do equilíbrio de poder entre fornecedor e cliente; do emprego junto a cada fornecedor de estratégias coerentes com a sua segmentação; de políticas e procedimentos para a gestão ativa e contínua de fornecedores; e de sistemas de informação que viabilizem esta gestão. Em um caso de sucesso da GlaxoSmithKline a sua área global de Suprimentos passou a priorizar a gestão de 30 fornecedores com maior impacto no seu negócio após classificar todos os seus 10.331 fornecedores de acordo com as variáveis “risco”, “criticidade” e “dispêndios”.

6. Equipe com perfil técnico e comportamental inadequado

Certa vez o VP mundial de RH de uma multinacional americana na qual eu atuei como executivo apresentou durante uma palestra vários estudos científicos para embasar a seguinte mensagem final: “A decisão mais relevante que um executivo toma é a decisão de contratar alguém, pois quando ele erra os custos diretos e indiretos para a organização são absurdamente altos.”. E os incrivelmente elevados índices de turnover no Brasil evidenciam o quão comum é este erro neste país, conjugado com outros problemas tais como deficiências na motivação, na retenção e no desenvolvimento dos colaboradores. Quantos executivos de Suprimentos podem afirmar que possuem equipes com o perfil técnico e comportamental adequado? E avaliar e desenvolver as competências comportamentais são um desafio ainda maior e mais crítico, corroborado pelo princípio (que eu observei e protagonizei na prática como executivo) de que “contrata-se por conhecimento e demite-se por comportamento”.

Em Suprimentos o perfil profissional ideal é complexo e multidisciplinar, englobando desde competências técnicas como capacidade analítica e quantitativa e conhecimento sobre categorias de fornecimento até competências comportamentais como liderança, relacionamento interpessoal e resiliência.

A minha recomendação aqui é: invista num relacionamento próximo com o RH da sua empresa e se engaje nas atividades que são absolutamente críticas para o sucesso de qualquer área, de Compras e Suprimentos inclusive: Recrutamento & Seleção, Avaliação de Desempenho, Desenvolvimento & Capacitação, etc. Estas são responsabilidades em última instância de todo e qualquer líder, tendo o RH um papel de “apoiador” e de “facilitador”.

7. Técnicas e ferramentas de sourcing defasadas e insuficientes

Por último, mas não menos importante, é o frequente problema do uso de técnicas e de ferramentas de sourcing defasadas e insuficientes. Se a sua área de Compras e Suprimentos ainda decide a contratação de fornecedores baseando-se somente no custo de aquisição e no atendimento a requisitos obrigatórios; perpetua antigos modelos de fornecimento; acata integralmente os escopos definidos pelos requisitantes; prioriza a obtenção de savings via negociações comerciais; adota contratos com preços fixos; não se envolve na implantação de novas soluções de fornecimento; não fiscaliza a gestão de contratos realizada pelos requisitantes; e se comunica remotamente com os seus fornecedores exclusivamente por telefone ou e-mail, então lamento informar que as suas práticas precisam ser urgentemente revistas.

O universo de técnicas e ferramentas que constituem um dos alicerces vitais de uma área de Compras e Suprimentos de alto desempenho é bastante amplo: Strategic Sourcing, Inteligência de Suprimentos, equipes multifuncionais, emprego de benchmarking e RFI (Request for Information), análises baseadas em TCO (Total Cost of Ownership), adoção de contratos baseados em performance dos fornecedores, uso de leilões reversos, processos automatizados via ferramentas de workflow e de Supply Chain Management e muitas outras.

Doutor e Mestre em Administração pelo COPPEAD/UFRJ e Bacharel em Ciência da Computação pela UFF. Possui 22 anos de experiência como Professor de Pós-Graduação e Graduação e como Palestrante e Instrutor no ILOS, Fundação Dom Cabral, UFRJ (COPPEAD, Escola Politécnica e FACC), FGV, INBRASC, IBEF e em cursos in-company (Coca-Cola, Shell, Rede Globo, GSK (Glaxo), Prudential Seguros, TechnipFMC, PetroRio e Sapura). Pesquisador em Julgamento & Tomada de Decisão no COPPEAD/UFRJ na cátedra Brasilprev e também via acordo de parceria entre CVM e COPPEAD. Autor de artigos (acadêmicos e não acadêmicos) e de casos de ensino publicados no Brasil e no exterior. Colunista do Investing.com, 2º website sobre investimentos com maior audiência no mundo. Ocupou por 8 anos posições executivas (de Gerente Geral inclusive) em Compras/Suprimentos na White Martins (Praxair), com responsabilidade sobre compras e contratos que perfaziam R$ 165 milhões anuais. Foi escolhido por duas vezes profissional de Suprimentos de maior destaque na Praxair, uma vez globalmente e outra na América do Sul. Liderou turnaround na área de Suprimentos Indiretos da Praxair, efetuando a transição de uma atuação transacional e reativa para uma estratégica baseada em projetos conjuntos com clientes internos, melhores práticas de mercado, TCO e gestão de KPIs. Possui 16 anos de experiência em outras áreas (Negócios, Vendas, Consultoria, TI e Auditoria) na CSN, Itaú/Unibanco, Ernst&Young, IBM, Xerox e Softtek. Desenvolveu projetos de Negociação, Strategic Sourcing, Segmentação e Gestão de Fornecedores, Desenvolvimento de Fornecedores, Análise Make or Buy, Business Plan, Valuation (de empresas e de projetos) e Economia/Finanças Comportamentais na White Martins (Praxair), SISTAC, Brasilprev, SENAC, Racional Engenharia, Gameleira Pelagio Fabião Bassani Advogados e Construtora Zayd.

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