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ESTRUTURA ORGANIZACIONAL E PROCESSOS INTEGRADORES: IMPORTÂNCIA E IMPACTOS NO DESEMPENHO LOGÍSTICO – PARTE 1

A evolução das atividades de logística e supply chain nas empresas brasileiras é clara e indiscutível para quem vivencia esta realidade há alguns anos. O escopo das funções logísticas tem aumentado, assim como a complexidade das mesmas.

O principal executivo da área tem alcançado níveis hierárquicos cada vez mais altos e com isso o espectro de atividades sob seu comando também: a incorporação de áreas como Produção, Suprimentos e Planejamento da Demanda tem, muitas vezes, transformado o executivo de Logística em executivo de Suply Chain Management de fato.

E como a estrutura organizacional da área tem evoluído para suportar estas mudanças de escopo e responsabilidades? A forma como a estrutura organizacional está composta pode trazer inúmeras vantagens para a empresa, mas também pode trazer uma série de atritos e ineficiências para o desempenho logístico. O desafio existe, principalmente, porque a logística, na prática, é uma sequência de processos interligados e mutuamente dependentes, conforme ilustrado na Figura 1.

A Figura 1 mostra como as atividades logísticas fazem parte de um único grande processo de suprimento, onde há um fluxo de informações e, em contrapartida, um fluxo de materiais. Uma estrutura organizacional preparada para o gerenciamento eficiente das atividades logísticas deve levar em consideração esta visão de processo e, com isso, a necessidade de coordenação e possibilidades de sinergia entre as atividades.

Mas, então, quão importante é a estrutura organizacional para o bom gerenciamento da cadeia de suprimentos? Alguns indícios mostram a relevância desta questão para os executivos da área:

  • Natureza multifuncional: o fato de existirem tarefas e áreas bem distintas dentro do supply chain, como suprimentos, planejamento da produção, previsão de vendas, distribuição, etc., faz com que a equipe precise ter diferentes perfis e
    conhecimentos, mas ao mesmo tempo saiba trabalhar de forma integrada e sinérgica, cada um entendendo como a sua atividade afeta o desempenho dos outros individualmente e o resultado global. Estruturar um organograma que facilite essa integração ao invés de gerar atritos certamente é um grande desafio.• Expertise e foco: a complexidade das atividades logísticas tem aumentado muito na última década devido a fatores como aumento dos SKUs, globalização, maior exigência de nível de serviço, etc. Cada vez mais são necessários ferramentas e cálculos sofisticados, análises mais abrangentes e treinamentos especiais. Isso tudo acaba por exigir profissionais de logística com formações voltadas para a área e muitas vezes experts em determinados temas. Ter uma divisão, diretoria, vice-presidência específicas de Logística e Supply Chain é crítico para atrair e comportar profissionais especializados, além de promover o devido foco no desempenho e nos desafios da área, não só para a equipe como para o principal executivo.
  • Envolvimento estratégico: o papel cada vez mais estratégico que a logística e o supply chain estão obtendo nas empresas, gerando reais vantagens competitivas de serviço e custo, deve estar refletido na estrutura organizacional, seja pelo nível do principal executivo, seja pelo escopo de atividades e responsabilidades.
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 Figura 1 – Atividades logísticas na visão de processos

 

E por fim, como último indício, existe a grande necessidade de gerenciar trade-offs de custos e níveis de serviços, conforme ilustrado na Figura 2. Significativas consequências podem ser ocasionadas pela fragmentação das atividades  logísticas dentro do organograma geral da empresa, tais como conflito de objetivos e de indicadores, baixa comunicação e troca de informações, todas elas culminando no pobre gerenciamento dos trade-offs logísticos, como custos de suprimentos x custos de produção, custos de transporte x custos de estoque, custo total x nível de serviço, etc..

  1. EVOLUÇÃO DA ORGANIZAÇÃO LOGÍSTICA

OEntender como as estruturas organizacionais na área evoluíram ao longo dos anos é de grande valia para os gestores perceberem os reflexos das mudanças ocorridas na área nos organogramas, assim como para os mesmos identificarem os estágios e modificações pelos quais as suas empresas passaram.

Segundo Bowersox (1996), até a década de 1950, a responsabilidade organizacional pela logística estava dispersa por toda a empresa. Tal fato nos sugere que as atividades logísticas eram executadas sem coordenação inter-funcional, resultando, possivelmente, em ineficiências. Troca de informações ruim e falta de responsabilidades claras ainda contribuíam negativamente para o quadro.

Posteriormente, surgiu um longo período de tentativas de agregação funcional, incentivadas pela necessidade de controle do custo total e pela crença de que a integração no dia a dia da operação aumentaria. A proximidade organizacional foi vista como o grande facilitador, que faria as pessoas entenderem o impacto de suas decisões e procedimentos nas demais áreas, permitindo que o grupo se orientasse para o desempenho global.

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 Figura 2 – Impactos da fragmentação das atividades logísticas

 

Foi só na década de 1980 que a visão por processos se tornou uma grande tendência, acompanhando os então novos conceitos de cadeia de valor e vantagem competitiva. Estes novos pensamentos influenciaram enormemente as práticas de gestão logística, não só pelo novo papel de criação de valor, mas porque finalmente as atividades começaram a ser vistas como parte de um processo único, que precisava ser gerenciado de ponta a ponta e cujo desempenho global é que importava.

A Figura 3 resume esta evolução, que culmina na integração das atividades logísticas, tendo a tecnologia de informação como grande facilitadora, habilitando a coordenação entre equipes separadas fisicamente e permitindo a combinação da logística com outras áreas, como marketing e manufatura.

No Brasil, ainda se podem encontrar exemplos de empresas para todos estes estágios de desenvolvimento. O grande desafio dos executivos é avaliar em que estágio sua companhia se encontra e qual a melhor abordagem para atingir o melhor nível de coordenação, considerando as competências atuais e futuras necessárias, a cultura corporativa e a abertura a mudanças, entre outras variáveis.

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 Figura 3 – Desenvolvimento da organização logística

 

Esta evolução pode ser mais bem visualizada e exemplificada pelos diferentes organogramas nas figuras seguintes, propostas por Bowersox (1996).

A Figura 4 mostra um exemplo de estrutura organizacional tradicional contendo somente as funções tipicamente envolvidas em operações logísticas.

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 Figura 4: Organização tradicional: sem visão de logística integrada

 

Pela Figura 3, esse organograma representaria o extremo esquerdo da fragmentação, pois as funções logísticas estão dispersas pela empresa, agregadas de forma funcional, ou, ainda, organizadas em “silos” verticalizados. Enquanto isso, conforme discutido na Figura 1, o processo logístico ocorre na horizontal, “cruzando” a empresa por suas várias áreas.

Na Figura 5 pode-se ver um início de agrupamento das funções logísticas, que Bowersox (1996) chama de Estágio 1, ainda que sem grandes alterações na hierarquia: o agrupamento no Marketing era com a visão de customer service e os avanços na área de manufatura foram em relação aos materiais. Uma organização com estas características ainda não é capaz de gerenciar os trade-offs logísticos de forma eficiente.

Já na Figura 6, o Estágio 2 tem como principal característica a colocação da logística numa posição de autoridade e responsabilidade organizacional mais alta. Esta independência e autonomia permitiram que a área se tornasse uma competência central e que defendesse e negociasse soluções e projetos com as outras áreas de igual para igual.

Dependendo da atividade-fim da empresa, a área de distribuição poderia ser elevada ao posto mais alto, ou a área de manufatura poderia incorporar as demais funções e se tornar o nível mais alto da logística. Mas, certamente, a falta de sistemas de informação adequados impediria uma integração completa.

Por último, sendo considerado o Estágio 3 por Bowersox (1996), está o organograma-exemplo da Figura 7. Mesmo com o surgimento dos executivos de Supply Chain Management, estas estruturas ainda são raras.

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 Figura 5 – Organização logística do Estágio 1

 

O objetivo é concentrar o máximo de funções operacionais e de planejamento logístico sob uma única autoridade e responsabilidade. Mas o mais interessante é como a separação das tarefas está organizada: existe uma clara divisão entre Operação, Planejamento e Projetos.

Pensar nestas três “categorias” de atividades faz todo sentido devido a diversos aspectos: o perfil dos profissionais é significativamente diferente, assim como suas capacitações e necessidades de treinamento. Além disso, a natureza das decisões e o horizonte das mesmas são distintos, bem como as informações e análises utilizadas.

Dentre as atividades da “Operação” estariam, por exemplo, a coordenação do recebimento de matéria-prima, a interface com a área de produção, o gerenciamento do picking e da expedição, o acompanhamento das entregas, o processamento dos pedidos, a colocação de ordens de compra e o tratamento de devoluções, entre outras. São áreas extremamente dinâmicas e que normalmente precisam “apagar incêndios” todo dia. O profissional que lida com estes desafios raramente consegue pensar em planejamentos de longo prazo, estratégias para o supply chain ou realizar análises demoradas para sua tomada de decisão, pois é consumido inteiramente pela operação. A natureza deste trabalho requer um profissional capaz de tomar decisões rápidas e com boa capacidade de liderança, já que normalmente trabalha com equipes relativamente grandes.

Já as atividades de “Planejamento” incluiriam o planejamento de demanda, estoques e ressuprimento mensais, a coordenação do processo de S&OP (Sales and Operations Planning) e o planejamento de recursos e capacidade, como tamanho da frota para os anos seguintes, ou ainda a
necessidade de expansão de uma fábrica ou de um armazém. O profissional de planejamento logístico tende a se diferenciar pela sua capacidade de análise e domínio sobre ferramentas de planejamento baseadas em TI.

A área de “Projetos” ainda é rara nas empresas, mas cada vez mais se pode encontrar pelo menos um ou dois profissionais nas empresas voltados para a melhoria contínua, para a revisão de processos, buscando novas tecnologias, trazendo indicadores e benchmarks e se atualizando com novas best practices, indo a eventos e visitas técnicas da área. Este tipo de trabalho pressupõe que o profissional seja capaz de elaborar novas soluções para a empresa, assim como implementá-las de maneira satisfatória.

  1. DIAGNOSTICANDO A ORGANIZAÇÃO LOGÍSTICA

Com este panorama da evolução da organização logística, o gestor já pode obter insights para avaliar a estrutura da sua área. Diferentemente de outras análises quantitativas e lógicas da área, não existe certo ou errado quando se trata de estrutura organizacional; não existem fórmulas ou “receitas de bolo” para aplicar a todos os casos. Certamente por isso as empresas estão constantemente alterando seus organogramas em um processo de tentativa e erro.

Por envolver questões como perfil e capacitação de profissionais, jogos de poder, cultura empresarial e hierarquia, a definição de organogramas é uma tarefa muito mais complicada do que se imagina e varia muitíssimo de empresa para empresa. Mas, sem considerar os “personogramas” e os potencias problemas políticos e olhando pelo lado mais técnico, o executivo de logística pode tentar diagnosticar sua área através de algumas dimensões mostradas na Figura 8.

Nessa figura se pode ver dois grande grupos de dimensões de análises:

  • Organização das atividades
    Neste grupo estão questões como divisão de responsabilidades, escopo e interfaces da área. O gestor deve se perguntar se a distribuição das atividades promove a fluidez do processo logístico ou faz com que os problemas usuais do dia a dia percorram caminhos intrincados para serem resolvidos. Ou, ainda, como estão separados os cargos ligados à Operação e os de Planejamento, conforme discutido na Organização do Estágio 3 (Figura 7).Muitas vezes existe também a oportunidade de se questionar o nível de centralização ou descentralização de algumas operações. Uma empresa que tem várias fábricas e/ ou centros de distribuição, por exemplo, pode encontrar ganhos bastante significativos com a centralização de decisões relativas a transportes (dimensionamento, contrailostação e programação de frota) e estoques (volume e mix a ser enviado para cada CD, evitando a falta de produto em um local enquanto há sobra em outro). No entanto, a centralização de decisões é adequada e efetiva somente quando há sinergias claras que não são aproveitadas com as responsabilidades descentralizadas.

 

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Figura 6 – Organização logística do Estágio 2 

 

Igualmente importante é o escopo de atuação da área de Logística/Supply Chain. Conforme se viu na seção anterior, a área foi, ao longo dos anos, acumulando várias funções que fazem parte do processo logístico, mas ainda existem inúmeras empresas brasileiras com escopo reduzido, seja porque a gestão de estoques está na área Industrial, o controle dos centros de distribuição com as regionais de venda ou ainda a coordenação da distribuição com o Marketing. Se as decisões de planejamento e execução logística forem tomadas em áreas distintas, é muito provável que haja algum grau de conflito entre elas. Este problema será pior ainda se os indicadores de desempenho destas áreas forem conflitantes, como, por exemplo, custo de estoques (quanto mais baixo melhor) e disponibilidade de estoques (quanto mais alto melhor).

Este ponto tem grande ligação com as interfaces da área de Logística. Quanto mais fragmentadas as atividades, mais interfaces com outras áreas existirão, demandando excessivos esforços de comunicação, de fluxo rotineiro de informações e de decisões em conjunto. Mesmo com todo este empenho é possível que muitas ineficiências ainda existam, conforme apontado na Figura 2, se as interfaces não forem minimizadas e ao mesmo tempo muito bem delineadas.

  • Papel e importância na organização O segundo grupo de questões é referente ao papel e à importância da logística na empresa. O nível de autonomia para o gestor questionar e mudar alguma situação neste sentido certamente é reduzido, mas sempre é válido mapear e refletir sobre os pontos a seguir, pois, dependendo do momento da empresa, da linha de diálogo estabelecida com os altos executivos ou das oportunidades e ganhos trazidos pela logística, a área pode passar a receber a atenção compatível.
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 Figura 7: Organização logística do Estágio 3

 

Mesmo em empresas de cultura mais informal ou onde a hierarquia tem pouca força, o posto ocupado pelo Executivo de Logística/Supply Chain sempre passa uma mensagem: indica o grau de autonomia e de responsabilidades da área, bem como a prioridade dos seus assuntos. Define também as suas interfaces e o nível de “igualdade” com as outras áreas (Industrial, Comercial, Financeira, etc.).

Bastante vinculada ao tema de nível hierárquico do principal executivo, está a participação da Logística na estratégia da empresa. Além da preocupação de que a missão e visão da área estejam alinhadas com a estratégia global da empresa, o seu principal executivo deve participar, juntamente com outras áreas, das decisões estratégicas da companhia, independentemente do seu nível hierárquico. Mesmo que o principal executivo de logística não esteja no mais alto nível hierárquico possível, nada impede que ele seja convocado para reuniões com o presidente, CEO ou diretor geral para discutir o papel da Logística na estratégia da empresa.

Por último, caso a área de Logística esteja subordinada a alguma outra área, como Comercial, Marketing ou Industrial, o principal executivo das funções logísticas, assim como o seu superior, devem estar cientes de que tal situação pode gerar perda de foco ou de prioridade para a área de Logística, seus desafi os e problemas. O fato de o mais alto executivo ter de se preocupar também com questões de outra área faz com que a atenção fi que inevitavelmente dividida. Além disso, o background desse executivo “compartilhado” pode gerar vieses na tomada de decisão que nem sempre são favoráveis ao custo logístico total e ao gerenciamento dos trade-offs.

Por exemplo, se o principal executivo responsável pela Logística for também responsável pela área Comercial (existem casos), ele vai conseguir equilibrar as decisões de ambas as áreas e manter o ótimo global, ou no fi nal do mês vai aprovar medidas para a “meta de vendas ser batida a qualquer custo” e deixar em segundo plano o quanto os picos de demanda do fi nal do mês poderão ser prejudiciais para a cadeia de suprimentos?

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 Figura 8: Dimensões de diagnóstico da organização logística

3 Conclusão

Existem muitas oportunidades ao se revisar a organização logística, sendo as maiores a redução da fragmentação das atividades e o aumento de iniciativas de planejamento e melhoria contínua. Adequar a estrutura organizacional aos processos logísticos e elevar seu executivo ao papel e importância compatíveis podem trazer uma série de vantagens, tais como:

  • Foco nas atividades logísticas;
    • Evitar a dispersão do conhecimento logístico;
    • Potencializar a implementação de projetos de melhoria;
    • Rapidez na identifi cação de problemas nas operações;
    • Redução do custo logístico total e melhor gerenciamento dos trade-offs.

Enquanto a primeira parte do artigo mostrou conceitos mais teóricos, a segunda parte deste artigo* vai apresentar os resultados de uma pesquisa com sete empresas de bens de consumo, que teve como objetivo averiguar o nível de integração propiciado pelas suas estruturas organizacionais e pelos seus processos de planejamento logístico.

A metodologia avaliou tanto a estrutura organizacional como um dos principais processos de integração nas empresas, o de S&OP. Através de entrevistas em profundidade e critérios pré-estabelecidos, foi possível classifi car estas empresas e seus níveis de integração numa escala única, sendo possível tirar uma série de conclusões e aprendizados.

4 Bibliografia

Bowersox, D.; Closs, D.. Logistics Management: The Integrated
Supply Chain Process, 1996, McGraw-Hill.

Autores: Leonardo Lincoln e Renata Figueiredo

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