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DESAFIOS PARA IMPLEMENTAÇÃO DE INICIATIVAS DE COLABORAÇÃO NO PROCESSO DE PLANEJAMENTO DA DEMANDA – PARTE 2

Na primeira parte deste texto, foram apresentados os principais motivadores para a implementação de iniciativas de colaboração no processo de planejamento da demanda, destacando os enormes benefícios pretendidos com essas práticas. No entanto, empresas que pretendam incorporar estas iniciativas precisam estar cientes dos grandes desafios na implementação e gestão do planejamento colaborativo da demanda.

Conforme descrito na parte I deste texto, entende-se por planejamento colaborativo da demanda as diferentes formas de cooperação interdepartamental e entre empresas de uma cadeia de suprimento, através da troca intensiva de informações e de mudanças organizacionais, estruturais e tecnológicas, para aumentar a eficiência do processo e das decisões relacionadas ao atendimento da demanda.

As iniciativas de planejamento colaborativo da demanda podem ser divididas em interna, quando ocorre entre áreas funcionais de uma empresa, e externa, quando envolve diferentes empresas. As principais iniciativas de colaboração/integração no planejamento da demanda são o S&OP – Sales and Operations Planning(integração interna) e o CPFR – Collaborative Planning, Forecasting and Replenishment (integração externa). Neste texto, estas duas iniciativas serão descritas brevemente e, em seguida, apresentados os desafios para implementá-las e geri-las.

Sales and Operations Planning (S&OP)

A iniciativa de S&OP busca aprimorar o processo de planejamento da demanda através da integração vertical entre níveis de decisões diferentes – estratégico e operacional – e integração horizontal entre decisões de mesmo nível, mas de diferentes áreas da empresa, tais como comercial, marketing, produção e logística. A Figura 1 apresenta os diferentes níveis de integração buscados pela iniciativa de S&OP:

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Figura 1 – Integração entre níveis de decisão e áreas da empresa 

A interação entre as diferentes áreas funcionais busca integrar as decisões de mesmo nível hierárquico, garantindo que todas as informações disponíveis serão compartilhadas e utilizadas no planejamento da demanda, bem como busca garantir que os esforços operacionais das áreas serão direcionados para o cumprimento dos objetivos planejados. No S&OP, o envolvimento da alta gerência se faz necessário para resolver os conflitos entre as áreas e tratar das divergências no processo de planejamento da demanda.

O processo de S&OP é, em geral, dividido em cinco etapas, conforme a Figura 2:

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Figura 2 – Etapas do processo de Sales & Operations Planning

A primeira etapa consiste na atualização dos relatórios com os dados reais de vendas e produção. Esta etapa deve ocorrer imediatamente após o fechamento do período de acompanhamento das vendas, que, em geral, é de um mês. Com base nessas informações, são feitas as análises estatísticas preparatórias para a realização da previsão de vendas na etapa seguinte.

Na etapa de planejamento da demanda, as análises estatísticas são avaliadas pelas áreas funcionais que incorporam as informações de mercado e o conhecimento tácito das atividades de atendimento da demanda. Como esta etapa depende fortemente do conhecimento do mercado e da proximidade com os clientes, a participação das áreas de Marketing e Vendas é fundamental.

A etapa seguinte consiste em realizar, com base nas previsões geradas, o plano de produção, que deve identificar de forma objetiva as restrições de capacidade para atendimento da demanda prevista. Na seqüência, tem-se a Reunião de Pré-S&OP, que confronta as análises realizadas nas etapas anteriores de forma independente pelas áreas funcionais da empresa. Nesta etapa, devem ser evidenciadas as divergências e preparada a pauta para a Reunião de S&OP Executiva.

Esta reunião, que deve envolver a alta administração da empresa, é a etapa de tomada de decisão e serve para solucionar as divergências, fechando os planos de vendas, produção e financeiro para o próximo período. Assim, o Sales and Operations Planning busca, através do compartilhamento das análises e informações das áreas funcionais, uma melhoria na interpretação das informações do mercado e integração das decisões para melhorar o atendimento da demanda.


Collaborative Planning, Forecasting and Replenishment (CPFR)

O CPFR é uma iniciativa de planejamento colaborativo da demanda entre empresas de uma cadeia de suprimento, que buscam uma maior assertividade no planejamento da demanda através do compartilhamento de previsões de venda e gerenciamento conjunto de estoques, resultando na melhoria dos níveis de serviço e diminuição dos custos operacionais e de estoques.

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Figura 3 – Etapas do processo de Collaborative Planning, Forecasting and Replenishment

A Figura 3 apresenta as etapas do processo de CPFR, conforme a configuração tradicionalmente apresentada pela literatura especializada. A primeira etapa consiste na elaboração de um acordo no qual as empresas envolvidas definem as normas para a colaboração, bem como as expectativas, responsabilidades e recursos utilizados no processo.

Após o alinhamento corporativo, é necessária a realização de um plano de negócios, definindo quais produtos participarão da iniciativa e quais os parâmetros de gerenciamento deles, isto é, pedidos mínimos e máximos, lead-time e freqüência de entrega e todos os demais parâmetros que influenciam o gerenciamento do atendimento da demanda.

Na etapa seguinte, em que se inicia a operacionalização do CPFR, as empresas envolvidas geram, de forma independente, as previsões de vendas. Cabe ressaltar que as empresas realizam as análises da previsão de vendas com as mesmas informações, ou seja, as vendas reais nos PDVs (pontos de vendas), calendário de promoções e ações de marketing de todas as envolvidas. Estas previsões são, então, confrontadas para identificação das divergências. A comparação entre as previsões é feita com base em parâmetros de convergência, isto é, são estipulados limites para a diferença entre os valores de previsão e, caso a diferença real seja maior do que o valor estipulado, tem-se uma divergência que deverá ser tratada.

O tratamento das divergências nas previsões é, em geral, realizado conjuntamente pelas empresas envolvidas no processo, que buscam identificar as suas possíveis causas. Entre as principais estão expectativas diferentes em relação à ação da concorrência e promoções/ações de marketing não comunicadas para as parceiras. Solucionadas as divergências, é realizado o planejamento de ressuprimento baseado nas previsões conjuntas.

As etapas seguintes consistem na identificação e tratamento das restrições de capacidade para atendimento dos pedidos propostos no plano de ressuprimento. As restrições devem ser negociadas entre as empresas envolvidas e, uma vez equacionadas, os pedidos são gerados.

O planejamento colaborativo entre empresas proporciona um aumento da visibilidade da demanda real, diminuindo, ou mesmo eliminando, o efeito “chicote”, à medida que as informações da ponta da cadeia são repassadas para outros elos e os estoques nas empresas são gerenciados em conjunto. Além disso, o CPFR favorece a construção de parcerias, viabilizando a elaboração de contratos para diminuição da marginalização dupla.


Desafios e limitações do planejamento colaborativo da demanda

Apesar dos enormes benefícios pretendidos com as práticas colaborativas, a implementação de políticas de cooperação apresenta enormes desafios para as empresas. As principais dificuldades estão relacionadas abaixo.


Barreiras culturais

As relações tradicionais entre empresas são baseadas, em geral, na tentativa de maximização da margem a ser absorvida na transação, isto é, cada empresa tenta negociar da melhor forma possível para conseguir a maior margem na transação comercial. Barganha por preço, “queda-de-braço” no final do mês e necessidade de cumprir cotas/metas de venda são assuntos corriqueiros quando se tenta analisar as relações comerciais entre empresas.

Este tipo de relação gera uma série de atritos e desgastes de ambas as partes ao longo do tempo. Além disso, as pressões por resultados imediatos fazem com que a mudança de uma relação de competição e negociação por margem (ganhos de curto prazo) para uma de compartilhamento de informações e decisões conjuntas (ganhos de longo prazo) enfrente grande resistência. Muitas vezes, as barreiras culturais para a mudança das relações constituem o principal fator determinante para o fracasso na implementação do planejamento colaborativo.


Falta de envolvimento da alta gerência no processo

O envolvimento da alta gerência no processo de planejamento colaborativo é fundamental, pois internamente ela é responsável pela eliminação das divergências entre as áreas e por garantir o alinhamento entre as estratégias funcionais. Já externamente, ela é responsável pelos acordos comerciais com as empresas parceiras. No entanto, a iniciativa de implantar uma política de planejamento colaborativo, em geral, surge nas áreas operacionais, como produção e logística. Dessa forma, o comprometimento da alta gerência com o processo nem sempre está garantido.

É necessário um esforço de convencimento interno para que a alta gerência se envolva neste tipo de iniciativa. Além disso, é necessário que o processo de planejamento colaborativo seja estruturado de forma a minimizar o tempo necessário de envolvimento da alta administração, ou seja, deve existir uma preparação prévia para que se utilize da melhor forma possível este tempo, evitando desperdícios e garantindo o envolvimento de todos. Dependendo do tamanho e da estrutura organizacional, o envolvimento da alta gerência pode ser a principal restrição para o sucesso de um processo de planejamento colaborativo da demanda.


Limitações de clientes e tipos de produto

A adoção de uma política de colaboração, interna ou externa, exige um grande esforço para geração das previsões, obtenção de consenso e elaboração dos pedidos. Por isso, não é possível adotar este tipo de iniciativa para todos os produtos e todas as empresas com quem se têm relações comerciais. É necessário selecionar os produtos de maior representatividade e os key customers para a realização deste tipo de iniciativa.

Esta seleção, no entanto, nem sempre é trivial. A existência de muitas inter-relações entre empresas e o número elevado de SKUs podem representar uma enorme barreira para o estabelecimento de um número limitado de parceiros para este tipo de iniciativa. Assim sendo, deve-se elaborar uma categorização para elencar os principais parceiros comerciais e quais serão os produtos que participarão do processo de planejamento colaborativo. A seleção inadequada de parceiros comerciais e/ou de produtos pode levar ao fracasso do processo de planejamento colaborativo e ao abandono desta prática.


Limitações de escala

O esforço envolvido para a geração de uma previsão de vendas por um processo de planejamento colaborativo é muito maior do que no processo tradicionalmente adotado pelas empresas. Isso porque existe a necessidade de interação, de troca de informações e eliminação de divergências nas análises entre as diferentes áreas funcionais e entre diferentes empresas.

Dependendo da complexidade existente nas inter-relações (número de produtos, pontos de vendas, substitutos, concorrentes, empresas e/ou áreas funcionais envolvidas), este processo pode demandar um número de homens/horas muito grande para a realização da previsão de vendas, o que pode inviabilizar a execução do planejamento colaborativo. Além disso, é necessário, em geral, um período de tempo para desenvolver habilidades e competências para o gerenciamento de exceções e tratamento de divergências. Como as empresas, em geral, trabalham próximas do seu limite de capacidade, este período de aprendizado inicial pode dificultar a implementação do planejamento colaborativo da demanda.


Problemas com bases de dados

Iniciativas de cooperação e colaboração exigem um grande investimento em tecnologia da informação, seja em sistemas transacionais sofisticados ou em bases de dados confiáveis. Isto ocorre porque é necessário trabalhar com os dados de venda mais próximos do consumidor final e estes precisam ser compartilhados por todos os elos da cadeia de suprimento. No entanto, cerca de dois terços das empresas usam dados agregados por centros de distribuição ou armazéns de fábrica e não dos pontos de venda.

A utilização inadequada de sistemas e bases de dados pode dificultar enormemente o trabalho de realização de um planejamento colaborativo da demanda e, muitas vezes, acarretar erros e problemas que tornam o método inadequado.


CONCLUSÃO

O Quadro 1 resume os principais motivadores e desafios para o planejamento colaborativo da demanda.

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Quadro 1 – Resumo dos principais motivadores e desafios

Os motivadores estão relacionados, conforme descrito na primeira parte deste texto, com as dificuldades e falhas no processo tradicional de planejamento da demanda, que acarretam perda de nível de serviço (rupturas de fornecimento) e/ou custos excessivos de estoques. Os desafios, por sua vez, decorrem da forma tradicional de organização das empresas e do formato de suas relações comerciais, que buscam, via de regra, ganhos de curto prazo.

É cada vez maior o número de corporações que buscam os benefícios de redução de custo e aumento de nível de serviço prometidos pelas iniciativas de colaboração no planejamento da demanda. Apesar dos motivadores para implementação destas iniciativas serem bastante claros e os benefícios promissores, é fundamental que as empresas estejam alertas para os desafios e o investimento que deverá ser realizado para o sucesso dessa empreitada.


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https://ilos.com.br

Sócio Executivo do ILOS. Graduado em Engenharia de Produção pela EE/UFRJ, é Mestre em Administração de Empresas pelo COPPEAD/UFRJ com extensão na EM Lyon, França, e doutor em Engenharia de Produção na COPPE/UFRJ. Tem diversos artigos publicados em periódicos e em revistas especializadas, sendo um dos autores do livro: “Previsão de Vendas: Processos Organizacionais & Métodos Qualitativos e Quantitativos”. Suas áreas de pesquisa são: Planejamento da Demanda, Serviço ao Cliente no Processo Logístico e Planejamento de Operações. Atuou durante 8 anos no CEL-COPPEAD/UFRJ, ajudando a organizar a área de Ensino em Logística. Em consultoria, realizou diversos projetos na área de logística, como Diagnóstico e Plano Diretor, Previsão de Vendas, Gestão de Estoques, Planejamento da Demanda e Plano de Capacitação em empresas como Abbott, Braskem, Nitriflex, Petrobras, Promon IP, Vale, Natura, Jequití, entre outras. Como professor, ministrou aulas em empresas como Coca-Cola, Souza Cruz, ThyssenKrupp, Votorantim, Carrefour, Petrobras, Vale, Via Varejo, Furukawa, Monsanto, Natura, Ambev, BR Distribuidora, ABM, International Paper, Pepsico, Boehringer, Metrô Rio, Novelis, Sony, GVT, SBF, Silimed, Bettanin, Caramuru, CSN, Libra, Schlumberger, Schneider, FCA, Boticário, Usiminas, Bayer, ESG, Kimberly Clark e Transpetro, entre outras.

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