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CENÁRIO DA INFRAESTRUTURA RODOVIÁRIA NO BRASIL

O transporte rodoviário é o principal meio para o deslocamento de cargas dentro do Brasil. Embora o Governo Federal venha aumentando os investimentos nos outros modais, o rodoviário ainda é responsável por quase 63% do TKU (toneladas por quilômetro útil) movimentado no País, tendo transportado, em 2008, mais de 770 bilhões de TKU, volume 14% superior ao registrado em 2006, segundo estudo do Instituto ILOS.

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Figura 1 – Matriz de transportes do Brasil
Fonte: ILOS, 2010

O grande volume movimentado e o fato de ser um dos modais com preço unitário mais elevado – perdendo apenas para o aéreo – fazem com que o transporte rodoviário de cargas tenha ampla representatividade nos custos logísticos do País. Em 2008, os gastos com a movimentação de carga pelas rodovias brasileiras foram de R$ 164,5 bilhões, ou 5,7% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro.
Ainda que a má conservação das rodovias seja alvo de reclamações de 90% dos executivos de logística do Brasil, uma vantagem do transporte rodoviário é que ele chega a praticamente todos os pontos do País, ao contrário do ferroviário e do hidroviário. O modal rodoviário também é capaz de responder de forma muito mais rápida à demanda das empresas, ao evitar certas formalidades necessárias em outros modais.RODOVIAS POR TODO O BRASILA malha rodoviária brasileira possui em torno de 1,6 milhão de quilômetros de extensão (de estradas pavimentadas e não pavimentadas), com uma densidade de 0,2 km/km2 de área do País. Mais da metade das estradas se localiza nas regiões Sul e Sudeste, as quais concentram 73% do Produto Interno Bruto nacional. Cerca de 80% das rodovias estão sob jurisdição municipal (1,3 milhão de quilômetros), com o restante sendo responsabilidade do Governo Federal e dos Estados – 76 mil km e 220 mil km, respectivamente (BRASIL, 2011b).

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Figura 2 – Mapa das rodovidas federais do Brasil
Fonte: Brasil, 2011b

Apesar de ter uma das malhas rodoviárias mais extensas do mundo, o Brasil ainda está muito aquém das principais economias do globo, com apenas 13% das rodovias pavimentadas. Em contrapartida, os Estados Unidos, país com características territoriais semelhantes, são cortados por 4,37 milhões de km de rodovias pavimentadas, malha 20 vezes maior do que a brasileira (214 mil km). Já a Índia, mesmo tendo um terço do território brasileiro, possui uma malha rodoviária pavimentada sete vezes maior do que a do Brasil (CIA, 2011; BRASIL, 2011a).Os problemas brasileiros não se resumem à extensão de estradas pavimentadas. Recente estudo realizado pela Confederação Nacional do Transporte (CNT) mostra que o estado geral das rodovias do País é deficiente. Quase 60% do trecho avaliado¹ foram considerados em mau estado, com problemas principalmente na geometria da via e na sinalização, além da má conservação da pavimentação (CNT, 2010).Asfalto de má qualidade, falhas de construção, falta de conservação e o excesso de peso dos caminhões são alguns dos fatores que afetam as condições das rodovias nacionais. Estudos apontam que 1% de carga acima do limite em um eixo isolado aumenta em 4,32% o desgaste do pavimento. Ou seja, se a sobrecarga for de 5% no caminhão, uma rodovia projetada para durar dez anos tem sua vida útil reduzida para 8,1 anos. Já se o peso exceder 20%, a durabilidade do pavimento vai cair para apenas 4,5 anos (REIS, 2011b).A fiscalização nas estradas é a principal forma de se evitar esse tipo de problema. Em 2010, as rodovias federais do Brasil tinham em operação 70 postos de pesagem (41 com equipamentos fixos e 29 com móveis), o que corresponde a um posto a cada 814 km de estrada. Nesse mesmo ano, quase dez milhões de caminhões e ônibus passaram pelos postos de pesagem, sendo que nove milhões foram avaliados nas balanças de precisão e 7% foram multados por excesso de peso.

O reflexo do mau estado de conservação das rodovias é o aumento no custo operacional dos caminhões. O excesso de buracos leva os veículos a reduzirem a velocidade, diminuindo o número de viagens possíveis por dia e, consequentemente, aumentando o custo por viagem. Além disso, quanto pior o estado de conservação da rodovia, maior o desgaste do veículo e maiores os custos variáveis, como combustível, peças, pneus, lubrificação e lavagem (REIS, 2011a). Segundo a CNT (2010), o custo operacional da frota nacional poderia ser reduzido em cerca de 25% caso todas as rodovias pavimentadas do Brasil estivessem em ótimo estado de conservação.

INVESTIMENTOS PÚBLICOS E PRIVADOS

Com o objetivo de melhorar a fiscalização nas estradas, o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT) lançou, em 2005, o Plano Nacional Estratégico de Pesagem (PNP). O PNP faz parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) desde 2007 e, na sua primeira fase, recebeu mais de R$ 260 milhões em investimentos. A segunda etapa do plano está prevista para 2011, com a construção, instalação, manutenção e operação de mais 161 postos de pesagem nas rodovias federais, projeto avaliado em R$ 1,1 bilhão.

Além da parcela relacionada ao Plano Nacional Estratégico de Pesagem, a primeira fase do PAC previu quase R$ 43 bilhões em investimentos para o modal rodoviário (BRASIL, 2010). Dentre os alvos desses investimentos está o projeto de duplicação da BR-101, considerado a principal obra do PAC por 84% dos executivos de logística em recente pesquisa do Instituto ILOS.

Os investimentos, porém, ainda estão abaixo das necessidades do País. Segundo estimativa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o Brasil precisa de R$ 183,5 bilhões em investimentos para resolver os problemas no setor rodoviário e torná-lo mais eficiente, resultando em um impacto positivo para a economia. O trabalho do Ipea levou em consideração as obras identificadas como necessárias em diversos levantamentos feitos pelo governo nos últimos anos, como o Plano Nacional de Logística e Transporte (PNLT), o Plano Plurianual, o Plano CNT de Logística e o Programa de Aceleração do Crescimento (IPEA, 2010).

Usando outra abordagem, o Instituto ILOS fez uma projeção do investimento necessário para que o Brasil reduza os gargalos existentes nas rodovias e disponha de uma malha rodoviária tão adequada quanto a dos Estados Unidos. Pelo estudo, o País precisaria de R$ 812 bilhões para pavimentar 560 mil km de malha e recuperar outros 126 mil km existentes. Esse investimento é 19 vezes maior do que o previsto pelo Governo Federal no PAC I para recuperação, pavimentação e construção de rodovias.

A queda no repasse de recursos federais para investimento em infraestrutura rodoviária ao longo das quatro últimas décadas levou o Governo Federal a buscar, a partir de 1995, empresas privadas para investirem no setor através do Programa de Concessão de Rodovias Federais. A escolha é feita por licitação, vencendo a empresa com a menor tarifa de pedágio. Através do programa, já passaram para a administração privada quase 15 mil km de estradas, com as concessionárias tendo investido, até 2009, cerca de R$ 20 bilhões para recuperação, ampliação e melhoria dos trechos concedidos (ABCR, 2011).

Em contrapartida aos investimentos, o governo permite às concessionárias explorar os pedágios nas rodovias. Apenas em 2009, a receita com pedágio no Brasil foi de R$ 8,3 bilhões, um aumento de 23% em relação ao ano anterior. Nesse período, passaram 1,1 bilhão de veículos pelos quase 15 mil quilômetros de estradas pedagiadas, sendo mais de 270 mil veículos pesados, como caminhões e ônibus (ABCR, 2011).

Outra forma utilizada pelo governo para captar recursos são as Parcerias Público-Privadas (PPP), opção que vem sendo empregada em rodovias com pouca ou nenhuma rentabilidade econômica. Nesse caso, a PPP é feita geralmente por concessão patrocinada, na qual o usuário paga uma tarifa e o governo complementa a receita para que o empreendimento se torne viável economicamente (Soares e Neto, 2006).

O PAPEL AMBIENTAL DO MODAL RODOVIÁRIO

A precariedade da infraestrutura rodoviária brasileira também tem impacto negativo nas emissões de gases de efeito estufa (GEE) e de poluentes na atmosfera. Quanto maior a qualidade do pavimento rodoviário, menor a variação de velocidade e o tempo da viagem, reduzindo o nível de emissão de GEE. Segundo Bartholomeu (2006), as emissões caem entre 0,01% e 0,2% em rodovias com melhores condições de pavimentação.

Essas reduções se tornam ainda mais significativas na medida em que o setor de transportes é apontado como o terceiro maior poluidor no Brasil e no mundo, atrás apenas da Mudança no Uso da Terra e das Indústrias. Em 2005, o setor foi responsável por 6,4% e 13,5% das emissões, respectivamente, sendo que o modal rodoviário contribui com a maior parte (88,6%) dos gases lançados pela atividade de transportes na atmosfera brasileira.

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Figura 3 – Matriz de transportes e matriz de emissões por modal no Brasil
Fonte: ILOS, 2011

A representatividade do transporte rodoviário nas emissões de GEE tem levado o Governo Federal e as empresas a investirem em sustentabilidade ambiental, criando leis, intensificando a fiscalização e lançando novas tecnologias. Um exemplo é a utilização de asfalto ecológico na pavimentação de rodovias, como a dos Imigrantes, em São Paulo. A adição de borracha de pneus à massa asfáltica produz um asfalto 40% mais resistente que o convencional, além de reduzir o ruído e melhorar a aderência dos veículos à pista. A tecnologia usa, em média, 600 pneus para produzir 1 km/faixa de asfalto ecológico, a um custo de R$ 90 mil/km/faixa, custo 30% superior ao do asfalto convencional (ILOS, 2011).

Ainda que o asfalto seja ecológico e esteja em perfeitas condições, é importante que a frota rodoviária contribua também para a redução na emissão de poluentes. Para isso, é necessário alterar o tipo do motor e o diesel utilizado. Em 2011, o Brasil chegou a uma frota de 1,4 milhão de caminhões, com idade média de cerca de 13 anos. Mais poluente que os demais modelos, o motor Pré- Euro (fabricados antes da aplicação das normas europeias que estipulam limites de emissão para os motores) ainda impulsiona 40% da frota nacional. Na Europa, apenas 26% dos caminhões utilizam o Pré-Euro, sendo que o Euro IV, que não será produzido no Brasil, já movimenta 16% da frota europeia.

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Figura 4 – Tipos de motores na frota: Brasil x Europa (2009)
Fonte: ILOS, 2011

Visando alterar o perfil da frota a diesel brasileira, o Governo Federal instituiu, em 1986, o Programa de Controle da Poluição do Ar por Veículos Automotores (Proconve). Através dele, o governo exige dos fabricantes motores menos poluentes e cobra das empresas produtoras de combustíveis reduções de emissões tóxicas. Segundo o calendário do Proconve, a partir de janeiro de 2012, todos os caminhões a diesel produzidos no Brasil deverão sair de fábrica com o motor Euro V, menos poluente, e as distribuidoras de combustíveis também deverão oferecer o diesel S50, cuja concentração máxima de enxofre é de 50ppm. Para 2013, a programação é que os postos já recebam o diesel S10 (com concentração máxima de enxofre de 10 ppm), ainda menos poluente.

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Figura 5 – Teor de enxofre no Brasil e no mundo
Fonte: ILOS, 2011

A dificuldade, porém, será colocar todo o sistema para funcionar em 2012. As montadoras já estão anunciando caminhões com os novos motores, mas a dúvida é quanto à disponibilidade do S50 nas bombas de combustíveis de todo o Brasil. O novo diesel exige infraestrutura especial para armazenamento, o que vai obrigar todos os postos a fazerem investimentos. Sem o S50, os novos motores terão uma redução automática de potência, trazendo pouco ou nenhum benefício ambiental.Outro problema decorrente da nova exigência do Proconve será o aumento nos custos das transportadoras. A expectativa é de que a nova frota de caminhões chegue com preços de 8% a 15% maiores. O novo diesel também deverá ter um custo maior e vai exigir ainda o uso de um reagente para fazer funcionar o sistema de pós-tratamento de gases dos motores Euro V.Além do diesel com menor concentração de enxofre, as distribuidoras também vêm investindo no biodiesel. Desde 1º de janeiro de 2010, o óleo diesel comercializado no Brasil contém 5% de biodiesel e a tendência é que esse percentual cresça nos próximos anos. O consumo do combustível com 5% de biodiesel é quase igual ao do diesel comum, mas com menos emissão de poluentes. Segundo estatísticas da Anfavea, a melhor combinação para o meio ambiente é a renovação da frota, com o uso do motor Euro V e diesel S50, resultando em um potencial de redução de poluentes de 34%.CONCLUSÃO

Embora boa parte da produção nacional seja movimentada através das rodovias, o Brasil ainda carece de uma infraestrutura rodoviária como a disponibilizada nas principais potências mundiais. Problemas como pistas não asfaltadas ou com asfalto em más condições, má sinalização e traçado inadequado interferem na movimentação dos caminhões, prejudicando questões como confiabilidade e consistência, além de afetar o consumo dos veículos, a emissão de gases de efeito estufa e o custo logístico total.
Impulsionado pelo desenvolvimento da produção nacional, o Governo Federal vem investindo na melhoria da qualidade da infraestrutura rodoviária do País, seja com capital público ou privado. Entretanto, os investimentos anunciados ainda estão aquém dos necessários para que as empresas brasileiras disponham de uma malha rodoviária de alto nível, que ajude a reduzir os custos totais e contribua para que as empresas nacionais concorram de igual para igual com os grandes players mundiais.
Além de uma infraestrutura eficiente, é importante também que se intensifique a preocupação em relação ao meio ambiente. A melhoria da qualidade das rodovias, junto com a atualização da frota e o uso de combustíveis e motores menos poluentes, contribui para a redução do impacto dos transportes nas emissões para a atmosfera.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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  • BRASIL, Ministério do Planejamento. Programa de Aceleração do Crescimento – Balanço 4 anos – 2007 – 2010, 2010.
    ______, Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes, PNV. 2011.
    ______, Mapa Rodoviário. Ministério dos Transportes. Disponível em http://www.transportes.gov.br/index/conteudo/id/35852. Data de acesso: 02/junho/2011.
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  • ECOVIAS,
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  • IPEA. Rodovias Brasileiras: Gargalos, Investimentos, Concessões e Preocupações com o Futuro. Brasília (Série Eixos do Desenvolvimento Brasileiro – Comunicados do Ipea no 52), 2010.
  • REIS, N.G. Impacto do estado das rodovias sobre o custo operacional dos caminhões. Disponível em http://www.guiadotrc.com.br/truckinfo/Artigos/impacto_mauestado_rodovias.asp. Data de acesso: 02/junho/2011.
  • REIS, N.G. Excesso de peso ganha manual. Disponível em http://www.portalntc.org.br/index.php?option=com_content&view=article&id=612:excesso-de-peso-ganha-manual&catid=38:destaques. Data de acesso: 03/junho/2011.
  • SOARES, R.P.; NETO, C.A.S.C. Das Concessões Rodoviárias às Parcerias Público-Privadas: Preocupação com o Valor do Pedágio. Brasília, IPEA (Texto para Discussão no 1186), 2006.

Maria Fernanda Hijjar é diretora de Inteligência de Mercado do Instituto de Logística e Supply Chain – ILOS
[email protected]
Alexandre Lobo é consultor da área de Inteligência de Mercado do Instituto de Logística e Supply Chain – ILOS
[email protected]
Tel.: (21) 3445-3000

¹ A avaliação da CNT levou em consideração quase 91 mil quilômetros de estradas, que correspondem à extensão de toda a rede federal pavimentada e às principais rodovias estaduais.

Autores: Maria Fernanda Hijjar e Alexandre Lobo

https://ilos.com.br

Sócia-Executiva do ILOS, possui mestrado e graduação em Engenharia de Produção pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Com mais de 10 anos de experiência na área de Logística e Supply Chain atuando em diversos projetos, gerenciamento e participação de pesquisas associadas ao tema. Possui mais de 20 artigos em jornais, revistas, periódicos e anais de congressos, sendo co-autora de diversos títulos da Coleção COPPEAD pela editora Atlas e da Coleção Panorama Logístico ILOS e CEL/COPPEAD.

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