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BIG DATA E S&OP – OS DOIS PODEM CONVIVER?

Há alguns anos um dos principais assuntos em pauta para os líderes de empresas é o S&OP, ou planejamento de vendas e operações, em português. Concebido nos anos 80, este processo nasceu com o objetivo principal de quebrar as barreiras entre as áreas funcionais, garantindo que todo o planejamento da empresa apontasse para um objetivo comum. A evolução recente deste conceito, da tecnologia de suporte, e o aumento da maturidade do processo em diversas empresas no Brasil e no mundo fizeram surgir o conceito de IBP (Integrated Business Planning), com um escopo um pouco mais abrangente e, notadamente, com uma participação maior do financeiro.

Mas apesar de existir há quase três décadas e já ter sido estabelecido como uma ótima maneira de timonear uma grande companhia, a importância do S&OP ainda não é completamente enxergada no mercado brasileiro, mesmo em grandes empresas. O conceito atinge o mercado em ondas de interesse, e ultimamente temos sentido que o assunto voltou a ficar em alta. Entretanto, hoje um novo nome entra na competição pelos olhos e ouvidos dos executivos, aparecendo repetidamente em discussões de redes sociais e artigos especializados: o Big Data. Alardeada como a nova onda em geração de valor para negócios, a expressão resume as inúmeras novas formas de captura de dados extremamente granulares e geração de informações antes inalcançáveis. Como todas as outras tendências, esta entra agora na disputa pelo tempo e recursos das companhias, e começamos a ver as referências ao Big Data ultrapassarem consideravelmente as referências ao S&OP.

Como entusiastas do planejamento integrado, começamos a avaliar até que ponto estes dois conceitos são concorrentes, e em que pontos ambos convergem. O objetivo deste artigo é explorar as sinergias dos dois processos, mostrando como a chegada do Big Data pode criar novas maneiras de gerar valor no processo de planejamento integrado.

O QUE É BIG DATA

Segundo o McKinsey Global Institute[1], o Big Data é um conjunto de informações cujo tamanho é maior do que os típicos softwares de bancos de dados conseguem capturar, armazenar e analisar. A definição é propositalmente subjetiva e se altera ao longo do tempo, na medida em que a capacidade de processamento e armazenamento de dados evolui. De acordo com a Lei de Moore, a capacidade computacional que conhecemos dobra a cada dois anos. Assim, uma definição mais precisa, em termos de bytes, do que se enquadra no conceito, se perderia facilmente em um pequeno espaço de tempo. Além disso, há também as diferenças entre setores do mercado, já que as ferramentas comumente utilizadas e a quantidade de dados que cada mercado está acostumado a lidar são bastante diferentes.

No mundo de hoje, onde mais de 600 milhões de smartphones estão conectados à internet, 30 bilhões de unidades de informação são compartilhadas mensalmente no Facebook, e pontos de venda tem cada vez mais tecnologia embarcada, as fontes de coleta de informação são abundantes. Esta nova avalanche de dados pode ser tanto de natureza quantitativa como qualitativa. Como exemplos podemos listar as citações de produtos ou estabelecimentos em redes sociais, opiniões de consumidores sobre a qualidade dos produtos em blogs e fóruns, sites de avaliação de produtos, informações de geolocalização de celulares, informações transacionais em pontos de vendas e informações de programas de fidelidade, que podem gerar insights valiosos sobre o comportamento e as preferências do consumidor.

Para a IBM[2], existem quatro dimensões principais que definem o que é Big Data: Volume, variedade, velocidade e veracidade.

  • Volume: Mesmo não tendo um limiar preciso, começamos a falar de Big Data a partir de terabytes (1000 GB) e petabytes (1000 TB) de dados a serem analisados de uma única vez.
  • Variedade: O dado pode ser coletado de diversas formas, estruturadas ou não, como textos de blogs, sons de podcasts e imagens em redes sociais.
  • Velocidade: A informação é gerada em tempo real e deve ser analisada, idealmente, na mesma velocidade para que decisões possam ser tomadas em frações de segundos, como informações de trânsito para sistemas de GPS recalcularem as rotas mais rápidas para o usuário.
  • Veracidade: Na maioria dos casos, não existe filtro de quem está gerando a informação nem de qual é a fonte e a veracidade. Mecanismos de qualificação dos dados devem ser empregados para garantir consistência, completude, atualização e acurácia.

Figura 1 – As dimensões do Big Data

Figura 1 – As dimensões do Big Data
Fonte: IBM

 

Simultaneamente às novas fontes de dados apareceram as novas tecnologias de armazenagem e tratamento destas informações. Diversos provedores de software correram para desenvolver novas soluções que atendessem este novo nicho. Existem várias linhas de desenvolvimento, mas a maioria usa abordagens como bases de dados não-relacionais e processamento em paralelo. Como exemplo podemos citar o Hadoop, uma plataforma open-source originada na Yahoo!, que usa uma abordagem de MapReduce para viabilizar o processamento, armazenamento e análise de grandes volumes de dados em paralelo. Isto é feito basicamente quebrando os dados em pequenos lotes que podem ser processados em diversas máquinas “commodity” ao mesmo tempo. Esta tecnologia caminha de mãos dadas com o processamento em nuvem, que permite que várias máquinas simples funcionem em conjunto, processando grande volume de dados a baixo custo.

UTILIDADES NO S&OP

Fica claro o potencial de geração de valor dos insights que podem ser extraídos desta inédita massa de dados. Segundo o mesmo estudo da IBM citado anteriormente, aproximadamente 49% das empresas que trabalham com Big Data se concentram em trazer resultados direcionados a seus clientes. Podemos citar como exemplos de resultado alcançado os programas de fidelidade de compras em supermercados, que podem sugerir promoções específicas cliente a cliente dependendo da época do ano. Ou uma montadora, que têm acesso ao comportamento dos seus clientes ao volante e desenvolvem tecnologias que tragam mais segurança e melhorem a manutenção preventiva dos veículos.

Mas como o S&OP, um processo de planejamento tático que, por definição, deve analisar a empresa de forma relativamente agregada, pode se beneficiar de dados tão detalhados quanto as vendas diárias de um produto em um ponto de vendas, para um cliente específico? Será que precisamos de um novo paradigma de planejamento, mais adaptado à avalanche de dados que está chegando? O assunto ainda é muito novo e existem poucos relatos de empresas de fato começando a usar estas informações em seus processos de planejamento integrado. Arriscamo-nos então a sugerir algumas maneiras nas quais o Big Data pode ser usado a favor de um S&OP mais robusto.

Tanto nas definições estratégicas como no acompanhamento da execução dos planos, as análises trazem novos direcionamentos que antes seriam impossíveis. Enxergamos os principais benefícios em quatro grandes grupos: compreensão da demanda, lançamento de novos produtos, satisfação do cliente e acompanhamento da execução.

COMPREENSÃO DA DEMANDA: Todo bom processo de planejamento começa com uma boa previsão de vendas. Conhecer o comportamento do mercado e como as ações da empresa impactam a demanda é fundamental para um bom balanceamento das operações, e dados detalhados de consumo podem trazer insights valiosos. Com informações mais detalhadas de clientes, é possível elaborar novas classificações de canais, com maior segregação geográfica e de consumo, podendo haver classificações distintas para a definição de promoções, descontos, tempo de atendimento e de foco da equipe de vendas. Isto permite ações de marketing mais cirúrgicas, com uma abordagem mais científica na mensuração do impacto destas no comportamento do consumidor. A análise da reação dos consumidores a uma ação de marketing por dia, por SKU e por ponto de venda, somada às informações qualitativas das redes sociais, traz a valiosa informação do impacto de cada ação em cada praça, com uma clara análise de retorno do investimento para cada tipo de ação. Isto facilita a modelagem de novas iniciativas para o futuro e embasa premissas de aumento de demanda, mitigando os riscos da sub e super estocagem. Novas tendências de consumo e oportunidades de cross selling podem ser detectadas localmente e extrapoladas para seu mercado regional, indicando oportunidades de direcionamento da equipe de vendas para reforçar produtos específicos do portfólio nos próximos meses, alinhando com a distribuição e a produção para garantir disponibilidade.

LANÇAMENTO DE NOVOS PRODUTOS: Estimar as vendas no começo do ciclo de vida de um produto é um grande desafio para a equipe de planejamento. Por mais que tenhamos diversas pesquisas amostrais de aceitação do produto e projeções da área de marketing, a sua real aceitação no mercado é sempre um ponto de interrogação. Nestes casos, a melhor abordagem é planejar o melhor possível com os dados em mãos, e acompanhar de perto a execução para levantar os alertas certos para a operação quando as vendas desviarem do plano. Com informações em tempo real do consumo de novos produtos nos caixas do varejo, por exemplo, é possível responder de forma mais rápida às incertezas que rondam estes lançamentos e garantir a disponibilidade. Com a visão do que realmente está sendo consumido, evita-se o “efeito chicote” e é possível redirecionar de maneira rápida e eficaz a distribuição geográfica dos produtos (direcionando o abastecimento para mercados que tenham uma melhor aceitação dos novos SKUs), e acionar ações emergenciais de produção e compra de insumos.

SATISFAÇÃO DO CLIENTE: O nível de serviço, junto à previsão de vendas e ao custo de atender o mercado, compõe um dos três principais grupos de indicadores estratégicos a serem acompanhados no S&OP. O monitoramento de redes sociais permite capturar diversas informações a respeito da satisfação dos clientes referente a um produto ou serviço. Números exatos são difíceis de estimar, mas é sabido que apenas uma pequena parte dos consumidores insatisfeitos fazem reclamações formais para a ouvidoria da empresa. Porém, é comum que muitos expressem sua opinião através das redes sociais, alardeando para quem quiser ouvir o quão insatisfeitos estão com um produto ou um serviço. O uso de ferramentas de text mining  para medir a incidência de palavras como “atraso” e “demora” junto à marca da empresa pode desencadear planos de ação específicos para melhorar o tempo de atendimento. Para ilustrar a força das redes sociais, segundo pesquisa da NM Incite [1](joint venture entre Nielsen e McKinsey, criada para estudar o impacto de medias sociais no consumo), no final de 2012, quase 60% dos americanos entre 18 e 24 anos buscam o serviço de atendimento ao cliente através das redes sociais e 71% daqueles que recebem um bom atendimento por este canal recomendam a marca a outras pessoas. O entendimento pleno das necessidades e expectativas dos clientes deve direcionar os custos de supply chain, e o estudo deste “sentimento” do mercado é uma das áreas mais pujantes que se forma em torno do Big Data.

Figura 2 - Resumo dos benefícios do Big Data

Figura 2 – Resumo dos benefícios do Big Data
Fonte: análise McKinsey Global Institute

 

ACOMPANHAMENTO DA EXECUÇÃO: Como falamos anteriormente, informações mais detalhadas de consumo do cliente final permitem aumentar a visibilidade da cadeia e planejar de maneira mais rápida e assertiva o quanto manter em estoque em cada localidade, sem depender da política de estoques ou da qualidade dos sistemas de armazenagem do varejista. Um bom exemplo são produtos que faltam nas gôndolas de supermercadistas e que aparecem em estoque mas estão com problemas de cadastro. Análises de diferenças entre sell in e sell out nestes varejos podem levantar alertas quanto a riscos de ruptura de estoque ou de vencimento de produtos. Quando o fornecedor do produto tiver a visibilidade do consumo do cliente final e não somente dos pedidos do varejista, será possível diagnosticar esse tipo de problema em tempo real, no momento que acontecer, por exemplo, uma queda inesperada das vendas. Isto embasa as análises de riscos e oportunidades que são o fundamento do processo de tomada de decisão no S&OP.

O RISCO DA ANALYSIS PARALYSIS

Mesmo com o aumento da capacidade de análise, é importante lembrar que os recursos continuam limitados, como a capacidade de investimentos em TI, a quantidade de pessoas para traduzir o resultado das análises, e os curtos prazos para as tomadas de decisão. Há ainda a imensa escassez de profissionais qualificados em análise de dados no mercado. Desta forma, um dos perigos do Big data – e mais especificamente para os processos de planejamento que começarem a utilizar as informações – é o de gastar muito tempo gerando análises e informações, sem conseguir chegar a nenhuma conclusão em tempo de se tomar de fato uma ação que agregue valor.

Dentro do período de análise do processo de S&OP, que geralmente ocorre em ciclos mensais, é preciso entender o que aconteceu na operação no passado e planejar o futuro, incluindo a avaliação dos impactos dos desvios de planejamento atuais. Se a quantidade de dados começa a crescer muito, e a possibilidade de análises se abre demais, é muito comum que a equipe do S&OP, responsável por apoiar as decisões dos gestores, não consiga gerar todas as análises em tempo, ou se perca com a “curiosidade” de entender melhor todas as novidades que começam a aparecer.

Por isso, é necessário foco no momento de estruturar como será o trabalho com o Big data dentro da companhia. O investimento em TI não é a única solução para alavancar os resultados da sua empresa com o uso do Big data. Algumas vezes o investimento excessivo em TI pode, inclusive, atrapalhar a evolução dos processos do entendimento do mercado e das suas operações. O ideal é uma combinação de equipe, tecnologia, processos e foco.

CONCLUSÃO

A utilização de Big Data pode trazer um valor expressivo para diversas áreas de companhias nas mais variadas indústrias, desde serviços financeiros até serviços de saúde. Segundo o estudo da McKinsey já citado anteriormente, o bom uso dessas novas informações corresponderia a um acréscimo de 300 bilhões de dólares para o sistema médico americano, 250 bilhões de euros para a administração pública da União Europeia ou de até 60% de aumento de margem dos varejistas americanos.

Exhibit 2

Exhibit 1

Figura 3 – Setores e tipos de benefícios obtidos com o Big Data
Fonte: análise McKinsey Global Institute

 

O processo analítico e decisório do S&OP é um ótimo meio para converter informações em ações e aprimorar significativamente o balanceamento entre vendas e operações, garantindo o alinhamento de toda a empresa a uma meta comum. Isto o torna um grande cliente da implantação de tecnologias de Big Data e, como todo grande cliente, deve estar incluído no levantamento de requisitos do projeto.

Porém é preciso cautela para conseguir transformar estas informações em valor real para o negócio e direcionar a tomada de decisões e planos de ações baseados nos novos insights. Esta mudança deve ser vista como uma virada de chave e não apenas como uma melhoria orgânica do processo. É necessário definir o objetivo a ser atingido com as novas informações, quais tipos de novas análises devem ser possíveis e como gerá-las. Deve-se buscar pessoas que tenham capacidade analítica para transformar terabytes de dados em informações de negócios, dimensionar investimentos em tecnologias de captura, analisar e armazenar  dados e repensar os processos da companhia. Será preciso transmitir a confiança necessária para o time gestor, que terá que cada vez mais que embasar suas decisões em dados do presente ao invés de olhar apenas para informações históricas.

Sobretudo, é preciso avaliar o nível atual de maturidade do processo de planejamento antes de incluir dimensões de Big Data, e garantir que já estamos extraindo tudo que podemos do cenário atual antes de dar o próximo passo. É preciso andar antes de correr.

[1] “Big data: The Next for innovation, competition, and productivity”, McKinsey Global Institute, 2011

[2] “Analytics: The Real-World Use of Big Data; how innovative enterprises extract value from uncertain data”, IBM Institute for Business Value, 2012

[3] “2012 NM Incite Social Care Survey”, NM Incite, 2012

Autor:
Diego de Souza, sócio diretor da Plannera – Soluções em Planejamento
Caio Rodrigues, gerente de projetos do ILOS – Instituto de Logística e Supply Chain

https://ilos.com.br

Graduado em Engenharia Civil pela PUC-Rio e Engenharia Industrial pelo INSA Lyon, sendo também certificado como Certified Supply Chain Professional pela APICS. Foi consultor de projetos do ILOS por 4 anos, atuando em projetos como definição de rede logística, previsão de vendas e S&OP em diversas indústrias, no Brasil e no exterior. Tem artigos publicados em revistas especializadas nos temas de previsão de vendas e tecnologia aplicada ao processo de S&OP. É atualmente sócio gestor da Plannera, empresa especializada em apoiar processos de S&OP.

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