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Transporte Rodoviário de Cargas – a perspectiva das empresas embarcadoras

Por Maria Fernanda Hijjar

Os custos de transporte representam mais de 60% dos custos logísticos das grandes indústrias brasileiras, fazendo com que os executivos voltem seus olhos para essa atividade em busca de oportunidades de redução de gastos. Mas o período conturbado da economia brasileira tem trazido muitas dúvidas em relação ao que irá acontecer com o segmento de transportes, especialmente no modal rodoviário de cargas. Se por um lado os itens de custo estão aumentando (inflação dos insumos dos veículos, alta no preço do diesel e dissídio dos motoristas), por outro lado a demanda por movimentação de cargas diminuiu, o que torna difícil o repasse dos aumentos de custos para os preços de frete. Este cenário está fazendo com que muitas transportadoras apresentaram prejuízos, aumentando o risco de falências.

Pelo lado das empresas embarcadoras que contratam transportadores, a baixa da economia trouxe a oportunidade de renegociações de preços de frete, pois o mercado se tornou muito ofertante, e sobrou capacidade nos caminhões. Entretanto, a pressão por redução de preços de frete aumenta o aperto sobre os transportadores, elevando o risco da interrupção dos serviços devido à falta de folego financeiro das empresas de transporte.

Com objetivo de entender quais as ações que estão sendo tomadas pelas empresas contratantes de transporte rodoviário durante o período de crise, o ILOS realizou uma pesquisa com 100 grandes companhias embarcadoras de carga no Brasil, pertencentes a 14 segmentos econômicos distintos. Os resultados do levantamento mostraram que 78% das empresas possuem um plano de ação formal para a diminuição de custos de transportes, com a grande maioria fazendo um acompanhamento regular das ações efetivas que estão sendo tomadas para concretização deste plano (Figura 1). Mas enquanto muitas empresas estão com seu foco voltado apenas para a realização de novos bids de mercado, buscando encontrar transportadores que cobrem preços mais baratos, outras priorizam a realização de projetos que geram maior produtividade nas operações e consequente redução de custos, não somente redução de preços dos prestadores de serviço.

Ações de melhoria de produtividade costumam trazer resultados mais duradouros e efetivos, levando a ganhos reais para as companhias, sem aumentar o risco de falha nos serviços dos transportadores.

Gráfico - Panorama ILOS – Transporte Rodoviário de Cargas 2016
Fonte: Panorama ILOS – Transporte Rodoviário de Cargas 2016

A busca por melhoria de produtividade em transportes pode ser uma tarefa bastante complexa, e que ainda não é realizada em todo o seu potencial pelas empresas brasileiras.

A pesquisa realizada pelo ILOS identificou as melhores práticas em transporte rodoviário adotadas pelas companhias embarcadoras em duas grandes frentes de ação: Gestão e Operação de transportes.

Na análise sobre a Gestão de transportes foram abordados aspectos como: contratos com os transportadoras, formas de pagamento do frete, índices de reajustes e indicadores de desempenho. No âmbito da Operação, foram analisados: os tempos com carga/descarga, a existência de compartilhamento de carga, janelas de horário de entrega, calendarização e centrais de tráfego.

Com base nas questões avaliadas, o ILOS identificou se cada empresa seria classificada como uma empresa que ainda precisava se Desenvolver, se já estava Em Desenvolvimento, ou se poderia ser considerada como Referência em transportes. A escala levou em consideração as diferenças entre setores econômicos, pois sabe-se que companhias de segmentos distintos têm necessidades e complexidades específicas. Por exemplo, uma empresa pertencente ao setor de agronegócio foi menos exigida em termos de contrato com os transportadores em comparação com empresas do segmento farmacêutico. Assim, uma empresa que realizava todas as ações em transporte esperadas para uma companhia de seu segmento econômico atingiria um “coeficiente de desenvolvimento em transportes” de 100%. Já uma empresa que não realizasse nenhuma dessas boas práticas teria seu coeficiente igual a 0%.

Os resultados da metodologia mostraram que, em média, o “coeficiente de desenvolvimento em transportes” das companhias brasileiras é de 74% (na escala de 0 a 100% criada pelo ILOS). Registrou-se que 11% das companhias ainda tinham muito a se Desenvolver (pois atingiram um coeficiente de apenas 60% ou menos). Mas a maioria das empresas (61%) poderia ser considerada Em Desenvolvimento no que diz respeito a atividades de transporte, pois atingiram um coeficiente entre 60% e 80%. Já as empresas consideradas como Referência em transportes somam 28%, tendo atingido um coeficiente superior a 80% (Figura 2).

Gráfico - Panorama ILOS – Transporte Rodoviário de Cargas 2016
Fonte: Panorama ILOS – Transporte Rodoviário de Cargas 2016

Ao analisar separadamente os aspectos de Gestão e Operação, percebe-se que as empresas são mais eficientes nas atividades de Gestão do que na realização da Operação propriamente dita. Enquanto a Gestão de transportes já se apresenta na fronteira de ser Referência (coeficiente médio de 78%), a Operação desta atividade ainda está Em Desenvolvimento (coeficiente médio de 69%), o que mostra uma certa dificuldade das companhias em colocarem em prática o que planejaram.

 

Gestão dos transportes

O acompanhamento de indicadores de desempenho está entre as principais ações de Gestão de transportes realizada pelas empresas embarcadoras de carga. O indicador mais utilizado é o atendimento do prazo de entrega, monitorado por 94% das grandes empresas contratantes de frete no Brasil. Na lista dos indicadores mais utilizados estão também o cumprimento da programação de embarque (monitorado por 93%), assim como o acompanhamento de avarias e contaminação das cargas que eventualmente ocorram (monitorado por 92%).

Outros indicadores como reclamações de clientes, acidentes, roubos e extravios e condições dos veículos também são acompanhados regularmente por uma parcela representativa das empresas embarcadoras de carga brasileiras (Figura 3). Vale uma ressalva, entretanto, sobre o monitoramento das condições dos veículos, que são mais frequentes em setores como o químico e petroquímico e farmacêutico. Este indicador, num passado distante, era pouco relevante para as companhias, e a frota envelhecida era uma característica comum para os caminhões brasileiros. Com o passar do tempo, e com os incentivos para renovação de frota adotados pelo país, este indicador ganhou força, e se tornou uma exigência para muitas empresas contratantes de transportes. Atualmente, embora as exigências em relação à frota ainda existam, a idade dos veículos passou a ser menos exigida pelas companhias, e a renovação dos caminhões perdeu força, apontando para um novo envelhecimento da frota brasileira no futuro próximo.

Gráfico - Panorama ILOS – Transporte Rodoviário de Cargas 2016
Fonte: Panorama ILOS – Transporte Rodoviário de Cargas 2016

Por sua vez, o ponto relacionado à Gestão mais negligenciado pelas companhias brasileiras diz respeito à mensuração de possíveis passivos trabalhistas que podem surgir dos motoristas de transportadoras e de autônomos: 68% das companhias não acompanham os possíveis passivos trabalhistas relacionado à utilização terceirizada de transporte rodoviário (Figura 4).

As regras trabalhistas que entraram em vigor com a nova Lei do Motorista aumentaram os riscos para as empresas contratantes de serviços de frete, e 8% dessas companhias já foram obrigadas a assumir algum passivo trabalhista de transportador ou autônomo.

Os riscos trabalhistas podem tentar ser minimizados a partir da assinatura de contratos com os prestadores de serviços. Mas devido ao período conturbado da economia, com incertezas em relação à demanda e aos preços, boa parte das empresas contratantes optaram por não se prenderem a contratos com seus prestadores de serviços. Exatamente por não conseguirem prever o quanto seria a necessidade de transporte para o futuro, e também para estarem livres para contratarem transportadores diferentes que oferecessem preços mais baixos, o número de empresas com contrato formal com seus operadores de transporte caiu de 94% em 2011 para 84% em 2015. Caiu também o tempo médio de contrato, que passou de 24 meses em 2011 para 20 meses em 2015. As indústrias do segmento de material de construção são aquelas que menos assinam contrato com seus transportadores: apenas 40% possuem contratos, e os restantes 60% não o fazem e nem pretendem formalizar esta prestação de serviços no futuro.

Gráfico - Panorama ILOS – Transporte Rodoviário de Cargas 2016
Fonte: Panorama ILOS – Transporte Rodoviário de Cargas 2016

 

Operação dos transportes

Quando se trata da Operação de transportes propriamente dita, o ILOS identificou grandes oportunidades de melhorias para as empresas embarcadoras de carga. A redução do tempo de carga e descarga, assim como o tempo de espera em fila dos caminhões é uma ação que deve ser constantemente realizada pelas empresas, pois este é um custo que pode ser bastante representativo na operação de transportes como um todo, especialmente para entregas de curtas distâncias.

No Brasil, o tempo médio de carga e descarga, incluindo fila, é de 5,5 horas (Figura 5). Os setores de alimentos e bebidas e comércio varejista são os segmentos onde são computados os maiores tempos (10 horas em média). Este tempo é considerado um período pouco ou zero produtivo. Como o caminhão é o principal ativo do transporte rodoviário, e o motorista é o maior custo de mão de obra, deixá-los ociosos gera perdas para a companhia, pois esta acaba precisando de mais veículos para cobrir a baixa utilização e improdutividade da operação.

O estabelecimento de Janelas de Horários para chegada dos caminhões é uma ação que pode ser utilizada para reduzir os tempos de espera de veículos. No Brasil, em média, 47% das entregas das grandes empresas brasileiras é realizada dentro de janelas de horário pré-estabelecidas junto aos clientes, o que indica uma oportunidade de melhoria para as 53% empresas restantes que ainda não trabalham com janelas de entrega.

Gráfico - Panorama ILOS – Transporte Rodoviário de Cargas 2016
Fonte: Panorama ILOS – Transporte Rodoviário de Cargas 2016

Vale citar também a oportunidade de Calendarização das entregas, especialmente as entregas fracionadas. A calendarização consiste na programação da chegada dos caminhões com os produtos solicitados em dias da semana específicos para cada cliente. Dessa forma, clientes de um mesmo agrupamento irão receber seus pedidos em 1 ou mais dias específicos da semana.

No Brasil, 77% das grandes empresas embarcadoras realizam alguma iniciativa de calendarização: 48% possuem dia da semana pré-estabelecido para a maioria das entregas enquanto 29% pré-definiram essas datas para a minoria das entregas. Para o futuro, os segmentos que mais estão buscando aumentar a calendarização são o farmacêutico, eletroeletrônico e automotivo.

Na busca pelo maior aproveitamento dos veículos, vale mencionar ainda que parte das empresas brasileiras permitem e incentivam que os transportadores compartilhem carga de outras empresas no mesmo caminhão utilizado pela companhia. Essa prática acontece em 44% das indústrias brasileiras e deve ser empregada sempre que possível. Sabe-se, entretanto, que na grande maioria das vezes, é o transportador quem fica responsável por conseguir o compartilhamento.

Por fim, o estudo realizado pelo ILOS mostra que somente 23% das grandes empresas embarcadoras de carga no Brasil montaram Centrais de Tráfego próprias para gerir de forma integrada as suas operações de transporte. Também chamadas de Centrais de Operações ou Torres de Controle de Tráfico, essas unidades de comando são responsáveis por coordenar as operações de transportes como um todo, gerando visibilidade e identificando oportunidades de sinergias entre as operações da empresa. De forma geral, uma Central de Tráfego atua na programação, execução e acompanhamento das atividades de movimentação de cargas de todas as unidades da companhia, capturando as necessidades de transporte, acionando transportadores e agindo para solucionar possíveis problemas. Por ser uma operação centralizada, é possível obter grande visibilidade para aproveitamento de sinergias em diferentes rotas, permitindo aumento da utilização de frete de retorno, viabilizando a realização de benchmarking entre operações, dentre outros benefícios que garantam maior eficiência e produtividade nos transportes.

Embora não sejam muitas as empresas que já implantaram Centrais de Tráfego próprias (22%), identificou-se que 19% pretendem implementar este controle centralizado no futuro, e que 21% utilizam as Centrais de Tráfego de seus transportadores (Figura 6).

Tabela - Fonte: Panorama ILOS – Transporte Rodoviário de Cargas 2016
Fonte: Panorama ILOS – Transporte Rodoviário de Cargas 2016

 

Conslusões

O transporte rodoviário é o maior custo logístico das empresas. Operar e gerir esta atividade exigem tarefas complexas, que ainda apresentam grandes oportunidades de melhoria.

No Brasil, 28% das companhias embarcadoras de carga podem ser consideradas como Referência em transportes, mas a grande maioria ainda está em Desenvolvimento ou têm muito a se Desenvolver. As maiores deficiências estão na Operação propriamente dita desta atividade: redução dos tempos de carga e descarga, agendamento de horários de entrega, calendarização, compartilhamento de carga e adoção de Centrais de Tráfego são exemplos de pontos a serem aprimorados.

No que diz respeito à Gestão dos transportes, a tarefa de acompanhamento de indicadores de desempenho já vem sendo realizada pela grande maioria das companhias, mas destaca-se que as empresas ainda precisam monitorar melhor os possíveis passivos trabalhistas que assumem ao contratar seus transportadores.

 

Referências

  • Panorama ILOS – transporte rodoviário de cargas: a perspectiva dos contratantes – edição 2016
  • Redução da frota com a calendarização da operação de distribuição fracionada, Paula Arantes.
  • Central de Tráfego: evolução no modelo de gerenciamento de transportes, Arthur Hill – Artigo da Revista Tecnologística (www.tecnologistica.com.br).

https://ilos.com.br

Sócia-Executiva do ILOS, possui mestrado e graduação em Engenharia de Produção pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Com mais de 10 anos de experiência na área de Logística e Supply Chain atuando em diversos projetos, gerenciamento e participação de pesquisas associadas ao tema. Possui mais de 20 artigos em jornais, revistas, periódicos e anais de congressos, sendo co-autora de diversos títulos da Coleção COPPEAD pela editora Atlas e da Coleção Panorama Logístico ILOS e CEL/COPPEAD.

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