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O PAPEL DO TRANSPORTE NA ESTRATÉGIA LOGÍSTICA

O transporte é uma das principais funções logísticas. Além de representar a maior parcela dos custos logísticos na maioria das organizações, tem papel fundamental no desempenho de diversas dimensões do Serviço ao Cliente. Do ponto de vista de custos, representa, em média, cerca de 60% das despesas logísticas, o que em alguns casos pode significar duas ou três vezes o lucro de uma companhia, como é o caso, por exemplo, do setor de distribuição de combustíveis.

As principais funções do transporte na Logística estão ligadas basicamente às dimensões de tempo e utilidade de lugar. Desde os primórdios o transporte de mercadorias tem sido utilizado para disponibilizar produtos onde existe demanda potencial, dentro do prazo adequado às necessidades do comprador. Mesmo com o avanço de tecnologias que permitem a troca de informações em tempo real, o transporte continua sendo fundamental para que seja atingido o objetivo logístico, que é o produto certo, na quantidade certa, na hora certa, no lugar certo ao menor custo possível.

Muitas empresas brasileiras vêm buscando atingir tal objetivo em suas operações. Com isso, vislumbram na Logística, e mais especificamente na função transporte, uma forma de obter diferencial competitivo. Dentre as iniciativas para aprimorar as atividades de transporte, destacam-se os investimentos realizados em tecnologia de informação que objetivam fornecer às empresas melhor planejamento e controle da operação, assim como a busca por soluções intermodais que possibilitem uma redução significativa nos custos. São inúmeros os exemplos de empresas com iniciativas deste tipo, destacando-se entre elas a Souza Cruz, Coca-Cola, Alcoa, OPP-Trikem, Brahma, Martins, Dow Química, entre outras.

Ao longo deste artigo, a função transporte será tratada inicialmente sob a perspectiva de integração às demais funções logísticas. Em seguida, os cinco diferentes tipos de modais serão classificados sob a ótica de custos e serviço. Também serão tratadas as questões que tornam a matriz de transporte brasileira desbalanceada. O artigo se encerra com uma discussão sobre os impactos que a tecnologia de informação, mais especificamente a Internet, vêm causando na gestão do transporte.

  1. INTEGRAÇÃO COM OUTRAS FUNÇÕES LOGÍSTICAS

Um dos principais pilares da Logística Empresarial moderna é o conceito de Logística Integrada, que está representado na figura 1. Através deste conceito as funções logísticas deixam de ser vistas de forma isolada e passam a ser percebidas como um componente operacional da estratégia de Marketing. Com isso, o transporte passa a ter papel fundamental em várias estratégias na rede logística, tornando necessária a geração de soluções que possibilitem flexibilidade e velocidade na resposta ao cliente, ao menor custo possível, gerando assim maior competitividade para a empresa.

Dentre os principais trade-offs que afetam a função transporte, destacam-se aqueles relacionados ao Estoque e ao Serviço ao Cliente.

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Transporte x Estoque

O ponto central deste trade-off é a relação entre políticas de transporte e de estoque. Dentro de uma visão não integrada, o gestor de estoques possui comumente o objetivo de minimizar os custos com estoque, sem analisar todos os custos logísticos. Este tipo de procedimento impacta de forma negativa outras funções logísticas, como por exemplo, a produção que passa a necessitar de uma maior flexibilidade (com lotes menores e mais freqüentes, ocasionando um custo maior) e uma gestão de transporte caracterizada pelo transporte mais fracionado, aumentando de uma forma geral o custo unitário de transporte. É importante deixar claro, que esta política pode ser a mais adequada em situações onde se utilizam estratégias baseadas no tempo, como JIT, ECR, QR. Estas estratégias visam reduzir o estoque a partir de uma visão integrada da Logística, exigindo da função transporte a rapidez e consistência necessária para atender os tamanhos de lote e os prazos de entrega. Além disso, em muitos casos a entrega deve ser realizada em uma janela de tempo que pode ser de um turno ou até de uma hora.

Outra questão importante ligada a este trade-off está associada a escolha de modais. Dependendo do modal escolhido, o transit time poderá variar em dias. Por exemplo, um transporte típico de São Paulo para Recife pelo modal rodoviário demora em torno de 5 dias, enquanto o ferroviário pode ser realizado em cerca de 18 dias. A escolha dependerá evidentemente do nível de serviço desejado pelo cliente, e dos custos associados a cada opção. O custo total desta operação deve contemplar todos os custos referentes a um transporte porta-a-porta mais os custos do estoque, incluindo o estoque em trânsito. Para produtos de maior valor agregado pode ser interessante o uso de modais mais caros e de maior velocidade.

Transporte x Serviço ao Cliente

O Serviço ao Cliente é um componente fundamental da Logística Integrada. Todas as funções logísticas vistas na figura 1 contribuem para o nível de serviço que uma empresa presta aos seus clientes. O impacto do transporte no Serviço ao Cliente é um dos mais significativos e as principais exigências do mercado geralmente estão ligadas à pontualidade do serviço (além do próprio tempo de viagem), à capacidade de prover um serviço porta-a-porta; à fllexibilidade, no que diz respeito ao manuseio de uma grande variedade de produtos; ao gerenciamento dos riscos associados a roubos, danos e avarias e à capacidade do transportador oferecer mais que um serviço básico de transporte, tornando-se capaz de executar outras funções logísticas. As repostas para cada uma destas exigências estão vinculadas ao desempenho e às características de cada modal de transporte, tanto no que diz respeito às suas dimensões estruturais, quanto à sua estrutura de custos.

  1. CLASSIFICAÇÃO DOS MODAIS DE TRANSPORTE

Os cincos modais de transporte básicos são o ferroviário, o rodoviário, o aquaviário, o dutoviário e o aéreo. A importância relativa de cada modal pode ser medida em termos da quilometragem do sistema, volume de tráfego, receita e natureza da composição do tráfego. A tabela 1 resume a estrutura de custos fixos-variáveis de cada modal, ao passo que a tabela 2 classifica as características operacionais de cada modal quanto à velocidade, disponibilidade, confiabilidade, capacidade e freqüência. Essas características serão discutidas a seguir.

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A velocidade refere-se ao tempo decorrido de movimentação em uma dada rota, também conhecido como transit time, sendo o modal aéreo o mais rápido de todos.

A disponibilidade é a capacidade que um modal tem de atender qualquer par origem-destino de localidades. As transportadoras rodoviárias apresentam a maior disponibilidade já que conseguem dirigir-se diretamente para os pontos de origem e destino, caracterizando um serviço porta-a-porta.

A confiabilidade refere-se à variabilidade potencial das programações de entrega esperadas ou divulgadas. Os dutos, devido ao seu serviço contínuo e à possibilidade restrita de interferência pelas condições de tempo e de congestionamento, ocupam lugar de destaque no item confiabilidade.

A capacidade refere-se à possibilidade de um modal de transporte de lidar com qualquer requisito de transporte, como tamanho e tipo de carga. O transporte realizado pela via marítima/fluvial é o mais indicado para essa tarefa. A classificação final refere-se à freqüência, que está relacionada à quantidade de movimentações programadas. Novamente, os dutos lideram o item freqüência devido ao seu contínuo serviço realizado entre dois pontos.

Conforme é ilustrado na tabela 2, a preferência pelo transporte rodoviário é em parte explicada por sua classificação de destaque em todas as cinco características. Transportadoras rodoviárias que operam sistemas rodoviários de classe mundial ocupam o primeiro ou o segundo lugar em todas as categorias, exceto no item capacidade.

No Brasil ainda existe uma série de barreiras que impedem que todas as alternativas modais, multimodais e intermodais sejam utilizadas da forma mais racional. Isto é reflexo do baixo nível de investimentos verificado nos últimos anos com relação à conservação, ampliação e integração dos sistemas de transporte. Apesar de iniciativas como o plano Brasil em Ação e o processo de  privatização de portos e ferrovias pouca coisa mudou na matriz brasileira, conforme pode ser visto na tabela 3. A forte predominância no modal rodoviário prejudica a competitividade em termos de custo de diversos produtos, como é o caso das commodities para exportação.

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  1. IMPACTOS DA INTERNET SOBRE O TRANSPORTE

A Internet bem como outras tecnologias de informação têm não apenas gerado necessidades específicas, mas também criados novas oportunidades para o planejamento, o controle e a operação das atividades de transporte. Dentre estas necessidades e oportunidades, poderíamos citar a crescente demanda por entregas mais pulverizadas, o surgimento de portais de transporte e o potencial para rastreamento de veículos em tempo real.

Pulverização das entegas

  • Entrega direta pelos fabricantes

Através da Internet, tornou-se possível para fabricantes de produtos de elevado valor agregado, como os computadores, a comercialização direta para os consumidores, eliminando da cadeia de suprimentos a necessidade de intermediários como distribuidores e varejistas. Anteriormente, o transporte de produtos entre fabricantes e seus principais clientes era marcada por uma maior concentração e estabilidade nos embarques, visto que os destinos dos clientes eram conhecidos e os mesmos procuravam renovar seus estoques periodicamente.  Nos EUA, a Gateway e a Dell dominam o mercado de vendas diretas de computadores pessoais pela Internet. A distribuição destes computadores é feita por transportadoras que possuem um elevado grau de penetração em diversos mercados. Na gestão do transporte, cada vez mais as empresas que realizam uma distribuição altamente pulverizada, buscam sistemas como roteirizadores para auxiliá-las na estruturação de rotas. O transporte é marcado por um curto transit time e grande flexibilidade na entrega, feita normalmene entre 1 e 2 dias.

Surgimento de portais de transporte

A Internet também está proporcionando o surgimento de novos negócios virtuais ligados à compra e venda de fretes. Na realidade, estão sendo estruturados portais na Internet que fazem a intermediação entre transportadores e embarcadores. Este tipo de modelo de negócio é caracterizado pela contratação de transporte spot. Com isso, o portal permite articular a necessidade de transporte de um embarcador, caracterizado pela origem, destino e o tipo de carregamento, com a oferta disponível. Em outras palavras, o portal busca um transportador que se interessa pelo transporte da carga, tentando ao mesmo tempo obter as melhores condições para o embarcador.

Rastreabilidade de carregamentos

Um das grandes vantagens que a Internet oferece na melhoria da qualidade de serviço é a possibilidade de rastrear carregamentos. Empresas de courier, agências marítimas, transportadores rodoviários, ferrovirios e operadores logísticos estão utilizando cada vez mais a Internet para disponibilizarem o status dos carregamentos para seus clientes. A Fedex, um dos maiores couriers americanos com faturamento superior à US$ 13 bilhões, estruturou no início da década de 90 um sistema de acompanhamento do pedido altamente sofisticado, recentemente beneficiado pela facilidade que a internet propicia. De modo semelhante, empresas brasileiras, como a Varig Cargo, também estão disponibilizando informações sobre o status da carga via internet.

  1. CONCLUSÃO

Este artigo abordou os impactos da função transporte nas empresas e na economia de países com relativo grau de desenvolvimento. Especificamente no ambiente empresarial foram exploradas as relações do transporte com outras funções logísticas: estoques e serviço ao cliente. Em seguida foram exploradas, em termos de custos fixos e variáveis e de dimensões de serviço logístico, as características dos cinco principais modais de transporte: rodoviário, ferroviário, aéreo, dutoviário e aquaviário. No Brasil, apesar de  iniciativas como a privatização de portos e ferrovias, o modal rodoviário ainda é dominante na matriz de transporte. Este fato, dependendo das características do produto, pode ser impeditivo para o atingimento de um maior nível de competitivadade em termos de custo. Finalmente foram comentados os principais impactos gerados pelo advento das novas tecnologias de informação, sobretudo a Interntet, sobre o gerenciamento, planejamento e operacionalização do transporte.

  1. BIBLIOGRAFIA
  2. BOWERSOX, D.J., CLOSS, D.J. 1996, Logistical Management – The Integrated Supply Chain Process, 1 ed, McGraw-Hill.
  3. CHRISTOPHER, M., 1997, Logística e Gerenciamento da Cadeia de Suprimentos – Estratégias para Redução de Custos e Melhoria dos Serviços, 1 ed. São Paulo, Editora Pioneira.
  4. LAMBERT, D.M., STOCK, J.R., ELLRAM, L.M., 1998, Fundamentals of Logistics Management, 1 ed. New York, Irwin-McGraw Hill.
Autor: Peter Wanke, Paulo Nazário e Paulo Fernando Fleury 

https://ilos.com.br

Doutor em Ciências em Engenharia de Produção pela COPPE/UFRJ e visiting scholar do Departamento de Marketing e Logística da Ohio State University. Possui os títulos de Mestre em Engenharia de Produção pela COPPE/UFRJ e de Engenheiro de Produção pela Escola de Engenharia da mesma universidade. Professor Adjunto do Instituto COPPEAD de Administração da UFRJ, coordenador do Centro de Estudos em Logística. Atua em atividades de ensino, pesquisa, e consultoria nas áreas de localização de instalações, simulação de sistemas logísticos e de transportes, previsão e planejamento de demanda, gestão de estoques em cadeias de suprimento, análise de eficiência de unidades de negócio e estratégia logística. Possui mais de 60 artigos publicados em congressos, revistas e periódicos nacionais e internacionais, tais como o International Journal of Physical Distribution & Logistics Management, International Journal of Operations & Production Management, International Journal of Production Economics, Transportation Research Part E, International Journal of Simulation & Process Modelling, Innovative Marketing e Brazilian Administration Review. É um dos organizadores dos livros “Logística Empresarial – A Perspectiva Brasileira”, “Previsão de Vendas - Processos Organizacionais & Métodos Quantitativos”, “Logística e Gerenciamento da Cadeia de Suprimentos: Planejamento do Fluxo de Produtos e dos Recursos”, “Introdução ao Planejamento de Redes Logísticas: Aplicações em AIMMS” e “Introdução ao Planejamento da Infraestrutura e Operações Portuárias: Aplicações de Pesquisa Operacional”. É também autor do livro “Gestão de Estoques na Cadeia de Suprimento – Decisões e Modelos Quantitativos”.

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