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Impactos do novo coronavírus na cadeia de Óleo e Gás


O isolamento social para contenção da propagação do novo coronavírus, de acordo com pesquisa feita pela CNT em 1º de abril, ocasionará queda no transporte no mês de abril de 40% ou mais para 58% dos entrevistados. Como consequência, o consumo de diesel, responsável por 25% do custo de transporte, também vem sofrendo drástica queda desde o mês de março. O mesmo panorama se repete para a gasolina, de forma ainda mais abrupta, com a queda da circulação de veículos de passeio. A Petrobras indica uma retração de 60% na venda de gasolina para as distribuidoras, em relação ao momento anterior à crise, e de 40% no diesel.

Para o consumidor, o impacto mais visível do vírus e do isolamento social no setor é a queda do preço nas bombas. A redução do preço do barril de petróleo é a grande responsável e ocorreu devido ao excesso de estoque mundial por queda no consumo e às disputas entre os maiores produtores.

A crise na indústria do petróleo, a maior nos últimos 100 anos, se estende por toda a cadeia de Óleo e Gás, contrariando as boas perspectivas e planos dos agentes dessa cadeia para 2020 no Brasil, frente às fortes mudanças que vinham ocorrendo, principalmente, com a abertura do mercado, a partir da venda de ativos da Petrobras.

coronavírus na cadeia de óleo e gás---ILOS-Insights Figura 1: Cadeia de Óleo e Gás. Análise: ILOS.

O Varejo é o final da cadeia de Óleo e Gás, representada pelos distribuidores e redes de postos. Do outro lado, tem-se a Exploração e Produção de petróleo ou Upstream, representado pelas grandes petroleiras e principalmente pela Petrobras. Ligando as duas pontas, tem-se a figura da Transpetro, responsável pelo transporte de petróleo entre plataformas e as refinarias, e o Refino, elo entre o petróleo e os combustíveis derivados comercializados pelas distribuidoras.

O impacto do coronavírus no Varejo

A Ipiranga, 3ª maior distribuidora do país, se deparou com redução de 33% nas vendas de diesel e de 63% nas vendas de gasolina e etanol na primeira semana de isolamento social, em linha com a redução das vendas da Petrobras. Os dados oficiais das vendas de combustíveis e biocombustíveis referentes ao mês de março, quando o primeiro caso de coronavírus foi divulgado no país e as medidas de restrição de circulação começaram a ser adotadas, serão divulgados pela ANP no final deste mês, quando então teremos estatísticas para pautar o impacto.

A empresa, juntamente com a Raízen, 2º maior player, seguiam em caminhos similares antes da crise, investindo na ampliação de lojas de conveniência. A Ipiranga, atualmente com o maior percentual de postos com lojas de conveniência de sua marca Ampm e detentora de operação logística para atendimento dessas lojas, tinha como plano abrir mais 250 lojas em 2020 a fim de crescer com capilaridade. Já a Raízen realizou uma joint venture recentemente com a Femsa, proprietária das lojas Oxxo, com plano original de abertura de lojas de rua em SP em 2020 e 500 lojas em 3 anos, e pretendia abrir 300 lojas de conveniência Shell Select em postos com a bandeira Shell por ano.

A maior distribuidora, a BR, foi privatizada em julho de 2019 com redução da participação acionária da Petrobras para 37,5%. Com a mudança na gestão, estão sendo realizados projetos de restruturação, para redução de custos e aumento da eficiência operacional. O foco na pré-crise também estava no investimento em novos negócios, como atuação como trading na importação e comercialização de derivados e etanol, e em serviços financeiros, com ampliação também de lojas de conveniência BR Mania, que trazem receita com a contratação de serviços logísticos e pagamento de royalties.

A conjuntura mudou e a corrida agora é para se ajustar à nova demanda, para um cenário que não deve mais alcançar os altos patamares de volume de 2014, e dar apoio aos seus maiores clientes, as redes de postos revendedores. Os postos sofrem ainda mais impacto na cadeia de Óleo e Gás, pois possuem baixo capital de giro e margens apertadas. Estes têm pleiteado apoio do governo e das distribuidoras para sobreviver à crise.

Dentre as reivindicações está a solicitação à ANP de desvinculação à bandeira na compra de combustíveis. Isso significa que postos de uma determinada marca poderiam comprar de quaisquer distribuidoras. Os postos de bandeira (p.e.: BR, Ipiranga e Shell) possuem custos mais altos que os de bandeira branca por, além de serem obrigados a adquirir produto da distribuidora da marca, pagarem royalties para utilização da bandeira. Essa permissão já foi concedida anteriormente à época da greve dos caminhoneiros e seria um mecanismo para redução no valor de compra do combustível. Porém, a ANP entende que a suspensão do regime vigente, além de não atacar o problema de queda de demanda, “é estruturante e exige a realização de consulta pública, uma vez que, além de afetarem direitos econômicos, também visam primordialmente à defesa de direitos básicos do consumidor”.

Os revendedores também alegam que as distribuidoras não têm repassado a redução de preço na gasolina e no diesel anunciada pela Petrobras. O reflexo é a prática de preços ainda elevados nas bombas, o que, segundo eles, prejudica ainda mais a venda. Devido à queda nas vendas que se propaga por toda a cadeia de Óleo e Gás, os estoques sendo repassados aos postos foram adquiridos a valores anteriormente praticados.

Por outro lado, as distribuidoras, como forma de preservar o negócio dos postos, têm concedido postergação e/ou parcelamento de pagamentos e postergação dos royalties no caso de postos bandeirados.

Mudanças no Refino

Diante da redução do consumo, o volume de óleo refinado está sofrendo alteração. A Petrobras alega que nenhuma refinaria irá parar a produção completamente, mas algumas unidades de processamento estão sendo paralisadas devido ao excesso de estoque. De acordo com o informado pelo sindicato de petroleiros ao Valor , no final da 1ª quinzena deste mês, a Regap (MG) já operava com menos de 40% de capacidade, a Repar (PR) com 50% e a Reman (AM) e até a maior refinaria, a Replan (SP), também podem ser afetadas.

A venda das 8 refinarias da Petrobras, responsáveis por 50% da produção nacional, foi postergada. O recebimento das propostas vinculantes ocorreria entre abril e maio de 2020. Dessa forma, até as empresas interessadas tomarem fôlego para realizar investimentos diante da crise, a Petrobras continuará com o monopólio do refino, ditando preços nos polos de oferta de produto a fim de balancear seus estoques, definindo, assim, toda a rede de distribuição do país.

A venda representa um passo importante na abertura do mercado. A Raízen e a Ipiranga vinham demonstrando interesse em participar do processo, a fim de aumentar a verticalização de suas operações e ganhar vantagens em relação aos demais competidores na região de influência dessas refinarias. A Raízen recentemente entrou no mercado de refino na Argentina, verticalizando sua operação no país vizinho. Por aqui, ela é uma das empresas mais verticalizadas do setor, por ser também sócia de usinas de etanol, da Logum Logística, operador dutoviário de etanol, e da Rumo logística, importante operador ferroviário.

A BR, impossibilitada de participar da oferta por ter 37,5% de participação acionária da Petrobras, também via a venda de forma positiva, como oportunidade de renegociar a política de preços na compra de combustível. Atualmente, mesmo sendo o maior player, não possui nenhum benefício de preço na aquisição de combustível em função de seu volume.

Acredita-se que o movimento de desinvestimento da Petrobras seja retomado após a passagem da pandemia, que trará maior estabilidade econômica para o país. Quando o plano de desinvestimento for posto em prática, haverá uma retomada da movimentação do setor, com a possível entrada de novos players, principalmente chineses, na cadeia de Óleo e Gás. A expectativa é a geração de concorrência e novos investimentos em infraestrutura de escoamento da produção, atualmente dependente da rede dutoviária da Transpetro.

Desinvestimentos na Transpetro

A empresa de logística da Petrobras realizará diversos cortes e desinvestimentos, de acordo com memorando divulgado no início do mês de abril, totalizando R$507 MM em 2020. O adiamento de manutenções de tanques e instalações está entre eles, assim como a devolução de prédios, suspensão de serviços e renegociação de contratos.

A Transpetro é atualmente gestora de diversos ativos: dutos para escoamento da produção de petróleo; dutos para movimentação de derivados a partir das refinarias para as bases das distribuidoras; terminais aquaviários e terrestres para armazenagem de petróleo e derivados; além de deter uma frota de 50 navios e realizar o abastecimento de combustível de regiões onde a produção das refinarias locais não é suficiente para suprir a demanda, como p.e. as Regiões Norte e Nordeste e o estado do Espírito Santo.

No cenário pós Covid-19, a privatização de parte ou da totalidade da Transpetro pode vir a ser discutida. Muitos funcionários da holding que estavam atuando na Transpetro retornaram à Petrobras e parte dos dutos operados pela Transpetro já estão sendo contemplados na oferta de venda de refinarias.

Redução da produção de petróleo

A China, onde a pandemia do novo coronavírus teve início, é um dos maiores importadores de petróleo. Por conta da redução da demanda pelo combustível, os países da Opep e aliados realizaram um acordo para limitar a produção do óleo, a fim de manter a cotação da commodity. A Rússia, porém, se negou inicialmente a segui-lo, gerando uma disputa com Arábia Saudita, que teve como consequência o aumento de produção pelos dois países. Após 34 dias da disputa entre os dois países, a guerra de preços se encerrou, quando os principais produtores concordaram em cortar a produção em maio e junho em 10 MM de barris por dia. Contudo, o imbróglio resultou na queda ainda mais acentuada da cotação do barril.

coronavírus na cadeia de óleo e gás---cotação---ILOS-Insights Figura 2: Histórico da cotação diária do petróleo tipo Brent. Fonte: Investing.com. Análise: ILOS.

O primeiro caso de Covid-19 foi divulgado na China em 31/12/2019. Como pode ser observado no gráfico abaixo, após essa data, o preço do barril tem caído vertiginosamente, oscilando entre US$22 e US$35 desde março, quando foi iniciada a quarentena no Brasil.

coronavírus na cadeia de óleo e gás---cotação-diária---ILOS-Insights Figura 3: Cotação diária do petróleo tipo Brent em 2020. Fonte: Investing.com. Análise: ILOS.

A redução drástica do consumo faz com que os estoques não sejam consumidos à taxa usual, gerando um excesso de oferta e sobre-estoque global. Se a redução na produção não acompanhar a queda na demanda, não haverá tancagem suficiente para armazenar toda a produção.
O excesso de petróleo produzido e não consumido está sendo estocado em volumes recordes em navios petroleiros, a um custo diário de US$350 mil por embarcação, como tancagem adicional às já esgotadas em terra.

Nesta semana, vimos a cotação do barril americano WTI para o contrato de maio, que venceu no dia 21 de abril, recuar mais de 300% na véspera, encerrando a um preço negativo pela 1ª vez na história. Os traders estavam dispensando seus contratos para evitar a entrega do petróleo produzido, ou seja, pagando para não entregar. Isso ocorreu porque o petróleo do tipo WTI precisa ser entregue e armazenado na cidade de Cushing, no estado de Oklahoma, EUA, onde há pouca ou nenhuma capacidade disponível. Eles passaram então a comprar contratos com vencimento em junho, na faixa dos US$20 o barril. O mesmo não acontece com o Brent, petróleo mais negociado e referência de mercado, pois o óleo pode ser entregue offshore onde houver capacidade de estocagem, não limitando, dessa forma, a operação de escoamento da produção.

Para que o preço do barril não caia ainda mais, prejudicando as petroleiras mundialmente, e a capacidade máxima de estocagem do óleo não seja atingida, a solução é a redução da produção.

Nessa linha, a Petrobras anunciou corte na produção de 200 mil barris/dia no final de março e publicou novos cortes em 1º de abril, como paralização de campos de produção, postergação de desembolso de caixa, redução de custos etc, como medida para preservação da companhia. As paralizações atuais já atingem 62 unidades.

De acordo com reportagem da Brasil Energia, inicialmente, na operação offshore, a Petrobras decidiu priorizar as negociações com empresas que prestam serviço de fornecimento de FPSOs, sondas e barcos de apoio. As ações para contenção de custos envolvem diferimento parcial de pagamento, paralisação de algumas unidades, redução de taxas diárias e até suspensão temporária dos contratos. As ações visam aliviar o caixa da companhia em 2020.

É prudente que as empresas considerem o preço do barril médio histórico , na faixa dos US$42, assim como o governo na estimativa de royalties e participações do setor público. Além disso, é saudável retomar as reformas, privatizações e demais ações para estimular a maior competição e busca por eficiência no mercado em cenário pós-crise.

Além da infraestrutura e logística: o impacto sob a ótica da saúde

As empresas da cadeia de Óleo e Gás já são conhecidas por forte políticas de segurança, meio ambiente e saúde. O produto e a operação em si envolvem certo grau de periculosidade e dano ao meio ambiente e saúde. Porém, com o risco de contágio pelo novo coronavírus, principalmente em ambientes que exigem confinamento como plataformas, algumas medidas foram tomadas para proteger os profissionais dessa indústria:

• Funcionários que desempenham funções administrativas estão atuando de home office. A Ipiranga, por exemplo, destacou que está realizando a contratação de psicólogos para apoio aos funcionários no novo formato de trabalho.

• As escalas de embarque nas plataformas da Petrobras aumentaram de 21 para 28 dias, com 14 dias de folga. Dessa forma, os trabalhadores offshore permanecem hospedados em um hotel por 7 dias, em quarentena, antes do embarque, e os que apresentarem sintomas característicos da Covid-19 serão impedidos de embarcar, a fim de reduzir a chance de contaminação a bordo.

• Algumas unidades também tiveram o efetivo reduzido de forma preventiva

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Engenheira de Produção pela UFRJ e Mestre em Administração pelo COPPEAD/UFRJ. Atua há 10 anos no setor, com experiência em projetos para redução de Custo, principalmente em Planejamento e Gestão de Transportes, Implantação de novos Processos/Sistemas e Revisão da Rede Logística. É especialista no mercado de Petróleo e Gás, mas com atuação em diversos setores como Farmacêutico, Higiene e Limpeza, Beleza, Fumo, Agronegócio e Siderurgia. Clientes para os quais já realizou projetos: BR Distribuidora, Petrobras, Ipiranga, AMPM, Transpetro, Souza Cruz, HalexIstar, Atvos, Bettanin, Tricon, Manetoni, Natura, IBP, Logum. Tipos de projetos já realizados: Plano Diretor de Logística, Planejamento e Gestão de Transportes, Implantação de Novos Sistemas/ Processos, Gestão de Estoques, Redesenho de Rede Logística, Elaboração e Condução de RFI/RFQ, Custo de Servir, Previsão de Vendas, Planejamento Estratégico.

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